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Saturday, January 16, 2021

Espiritismo: Chico Xavier contra a Santa Igreja Católica.


Bruno Braga.
Notas publicadas no Facebook.

I.
É de conhecimento público a existência de pessoas que se dizem “católicas” e que levam uma “vida dupla” entre a Santa Igreja e o Espiritismo. Elas desconsideram a proibição formal e até mesmo os riscos espirituais [1]. Acreditam poder conciliar o que é escandalosamente inconciliável. Porém, algumas dizem mais. Apegam-se à imagem de um Chico Xavier “amoroso” e “afável”, para acusar a própria Igreja de “preconceito”, alegando com um ou outro recorte biográfico que o médium era até mesmo “católico”. Os que dizem isso no mínimo não sabem o que estão falando.
A questão não é mero “preconceito”. De “gostar” ou “não gostar” do Espiritismo. Chico Xavier evidentemente não era “católico”, e nem foi “amoroso” e “afável” para com a Santa Igreja. A prova documentada está no livro “A Caminho da Luz” [2], onde o médium espírita associa a Igreja Católica à Besta do Apocalipse e o Papado ao número da Besta (666). Eis o texto:
“E a figura mais dolorosa, ali relacionada, que ainda hoje se oferece à visão do mundo moderno, é bem aquela da igreja transviada de Roma, simbolizada na besta vestida de púrpura e embriagada com o sangue dos santos”. [...] “Reza o Apocalipse que a besta poderia dizer grandezas e blasfêmias por 42 meses, acrescentando que o seu número era o 666 (Apoc. XIII, 5 e 18). Examinando-se a importância dos símbolos naquela época e seguindo o rumo certo das interpretações, podemos tomar cada mês como sendo de 30 anos, em vez de 30 dias, obtendo, desse modo, um período de 1260 anos comuns, justamente o período compreendido entre 610 e 1870, da nossa era, quando o Papado se consolidava, após o seu surgimento, com o imperador Focas, em 607, e o decreto da infalibilidade papal com Pio IX, em 1870, que assinalou a decadência e a ausência de autoridade do Vaticano, em face da evolução científica, filosófica e religiosa da Humanidade”. / “Quanto ao número 666, sem nos referirmos às interpretações com os números gregos, em seus valores, devemos recorrer aos algarismos romanos, em sua significação, por serem mais divulgados e conhecidos, explicando que é o Sumo-Pontífice da igreja romana quem usa os títulos de ‘VICARIVS GENERALIS DEI IN TERRIS’, ‘VICARIVS FILII DEI’ e ‘DVX CLERI’ que significam ‘Vigário-Geral de Deus na Terra’, ‘Vigário do Filho de Deus’ e ‘Príncipe do Clero’. Bastará ao estudioso um pequeno jogo de paciência, somando os algarismos romanos encontrados em cada título papal a fim de encontrar a mesma equação de 666, em cada um deles”. / “Vê-se, pois, que o Apocalipse de João tem singular importância para os destinos da Humanidade terrestre” [3].
A acusação é por si só hedionda – e historicamente falsa. Mas, tem ainda um agravante. No “antelóquio” da obra mencionada, Chico Xavier afirma que pretende “mostrar a verdadeira posição do Evangelho de Cristo” e dar uma “contribuição” à “tese religiosa” [4].
II.
Em seu livro “A Caminho da Luz”, Chico Xavier levanta uma série de acusações contra a Santa Igreja Católica, valendo-se de falsificações, estereótipos e lugares comuns desmentidos até mesmo por ateus ou não-católicos (p. ex. Rodney Stark). Desprezando o fato de que o próprio Cristo estabeleceu o primado de Pedro e a fundação da Igreja Católica (Mt. 16, 18), o médium espírita não só aponta a criação do Papado séculos depois, como atribui ao Papado mesmo todos os horrores ao longo da história: “Dessa data em diante, ia começar um período de 1260 anos de amarguras e violências para a civilização que se fundava” (pp. 137-38).
Continuo aqui o que apresentei em “nota” anterior [5], a documentação das investidas de Chico Xavier contra a Santa Igreja. Do médium que ditos “católicos” ainda têm como “exemplo” e “modelo” de “tolerância religiosa” e até mesmo de “católico”. Estes são mais alguns extratos da obra mencionada [6]:
“As autoridades eclesiásticas compreendem que é preciso fanatizar o povo, impondo-lhe suas ideias e suas concepções” [...] p. 141. Sobre os primórdios do Cristianismo.
“A igreja de Roma, que antes da criação oficial do Papado considerava-se a eleita de Jesus, ao arvorar-se em detentora das ordenações de Pedro, não perdia ensejos de firmar a sua injustificável primazia junto às suas congêneres de Antioquia, de Alexandria e dos demais grandes centros da época. Herdando os costumes romanos e suas disposições multisseculares, PROCUROU UM ACORDO COM AS DOUTRINAS CONSIDERADAS PAGÃS, pela posteridade, MODIFICANDO AS TRADIÇÕES PURAMENTE CRISTÃS, adaptando textos, improvisando novidades injustificáveis e organizando, finalmente, O CATOLICISMO SOBRE OS ESCOMBROS DA DOUTRINA DETURPADA”. [...] “É assim que aparecem novos dogmas, novas modalidades doutrinárias, o culto dos ídolos nas igrejas, as espetaculosas festas do culto externo, copiados quase todos os costumes da ROMA ANTICRISTÔ. pp. 141-42.
“O Papado era a obra do orgulho e da iniquidade” [...] p. 145. – “As forças do mal, aliadas à incúria e vaidade dos homens, haviam obtido um triunfo relativo e transitório”.
[...] “as poucas qualidades cristãs da Igreja Católica” [...] p. 153.
[...] “a Igreja poucas vezes compreendeu a tarefa de amor” [...] p. 157.
“A Inquisição foi obra direta do papado, e cada personalidade, como cada instituição, tem o seu processo de contas na Justiça Divina”. p. 160.
“A Igreja, contudo, proibindo o exame e a livre opinião, prejudicou esse surto evolutivo” – sobre o Renascimento. p. 168.
[...] “inspiraram ao CÉREBRO OBCECADO e DOENTIO de Inácio de Loiola a fundação do jesuitismo, em 1534”. [...] p. 176. - “A Companhia de Jesus, de nefasta memória, não procurava conhecer os meios, para cogitar tão-somente dos fins imorais a que se propunha”. p. 177.
[...] “a Igreja usurpadora” [...] p. 178.
[...] “o ascendente dos dogmas absurdos da Igreja” (198) [...] “A Igreja Romana era culpada de semelhantes desvios. Dominando a ferro e fogo, conchegada aos príncipes do mundo, não tratara de fundar o império espiritual dos corações à sua sombra acolhedora. Longe da exemplificação do Nazareno, amontoara todos os tesouros inúteis, intensificando as necessidades das massas sofredoras. Extorquia, antes de dar, conservando a ignorância em vez de espalhar a luz do conhecimento”. p. 199.
[...] “a Igreja não cuidou de outra coisa que não fosse o seu reino perecível. Esquecida de Deus, NUNCA procurou equiparar a evolução do homem físico à do homem espiritual, prendendo-se a interesses rasteiros e mesquinhos da política temporal”. p. 207.
III.
Em “nota” anterior, evidenciei a declaração de Chico Xavier de que o propósito do seu “A Caminho da Luz” era “mostrar a verdadeira posição do Evangelho de Cristo” e dar uma “contribuição” à “tese religiosa” [7]. Para isso, o médium espírita faz uma série de acusações falsas contra a Santa Igreja Católica, inclusive associando-A à Besta do Apocalipse [8], para então “consagrar” o Espiritismo. Allan Kardec, o “fundador” do Espiritismo, seria como que o “instrumento” de um “novo” pentecostes. Escreve Chico Xavier:
[...] “Aproximavam-se OS TEMPOS EM QUE JESUS DEVERIA ENVIAR AO MUNDO O CONSOLADOR, de acordo com as suas auspiciosas promessas. Apelos ardentes são dirigidos ao Divino Mestre, pelos gênios tutelares dos povos terrestres. Assembleias numerosas se reúnem e confraternizam nos espaços, nas esferas mais próximas da Terra. UM DOS MAIS LÚCIDOS DISCÍPULOS DO CRISTO BAIXA AO PLANETA, COMPENETRADO DE SUA MISSÃO CONSOLADORA, e, dois meses antes de Napoleão Bonaparte sagrar-se imperador, obrigando o papa Pio VII a coroá-lo na igreja de Notre Dame, em Paris, nascia ALLAN KARDEC, aos 3 de outubro de 1804, com a sagrada missão de abrir caminho ao Espiritismo, A GRANDE VOZ DO CONSOLADOR PROMETIDO AO MUNDO PELA MISERICÓRDIA DE JESUS-CRISTO (sic)” [9].
Uma observação sobre a questão histórica, para que ela não fique inconteste no repertório de Chico Xavier contra a Igreja Católica. Foi Napoleão que colocou a coroa sobre a própria cabeça, uma quebra da cerimônia, pois o Papa não queria ser associado à concessão de um poder imperial. Ademais, Pio VII excomungou Napoleão, e depois acabou preso.
Mas o médium espírita insiste no louvor a Allan Kardec e seus “colaboradores”:  
[...] “AS LIÇÕES SAGRADAS DO ESPIRITISMO iam ser ouvidas pela Humanidade sofredora. Jesus, na sua magnanimidade, repartiria o pão sagrado da esperança e da crença com todos os corações”. / “ALLAN KARDEC, todavia, NA SUA MISSÃO DE ESCLARECIMENTO E CONSOLAÇÃO, fazia-se acompanhar de uma plêiade de companheiros e colaboradores, cuja AÇÃO REGENERADORA não se manifestaria tão-somente nos problemas de ordem doutrinária, mas em todos os departamentos da atividade intelectual do século XIX. A Ciência, nessa época, desfere os voos soberanos que a conduziriam às culminâncias do século XX” [...] “A DÁDIVA CELESTIAL do intercâmbio entre o mundo visível e o invisível chegou ao planeta nessa onda de claridades inexprimíveis. CONSOLADOR DA HUMANIDADE, SEGUNDO AS PROMESSAS DO CRISTO, O ESPIRITISMO vinha esclarecer os homens, preparando-lhes o coração para o perfeito aproveitamento de tantas riquezas do Céu” [10].
Segundo Chico Xavier, Allan Kardec seria um “enviado” de Cristo para um “novo” pentecostes, “esclarecendo” e “consolando” os homens com uma “doutrina” escandalosamente contrária à que o próprio Cristo ensinou, e colocando o Espiritismo no lugar da Santa Igreja Católica que o Filho de Deus mesmo fundou. Na próxima “nota” sobre o assunto esse propósito descabido ficará ainda mais claro.
IV.
Chico Xavier é tido não só como um “sábio”, uma pessoa “amorosa” e “afável”, mas também como símbolo do “respeito” às religiões. Essa imagem, no entanto, contrasta tanto com a tentativa de desmoralizar a Santa Igreja Católica [11] quanto com a sua proposta de “mostrar a VERDADEIRA posição do Evangelho de Cristo” com uma “contribuição” à “tese religiosa”: para o médium, o Espiritismo é o único (!) meio de “salvação” da humanidade [12]. Deixo que o próprio Chico Xavier fale:
“A Igreja Romana era CULPADA de semelhantes desvios. Dominando a ferro e fogo, conchegada aos príncipes do mundo, NÃO TRATARA DE FUNDAR O IMPÉRIO ESPIRITUAL dos corações à sua sombra acolhedora. Longe da exemplificação do Nazareno, amontoara todos os tesouros inúteis, intensificando as necessidades das massas sofredoras. EXTORQUIA, ANTES DE DAR, CONSERVANDO A IGNORÂNCIA EM VEZ DE ESPALHAR A LUZ DO CONHECIMENTO”. – E a sequência imediata do texto deixa claro o propósito evidente de substituir a Igreja Católica pelo Espiritismo: “A tarefa de Allan Kardec era difícil e complexa. Competia-lhe REORGANIZAR O EDIFÍCIO DESMORONADO DA CRENÇA, RECONDUZINDO A CIVILIZAÇÃO ÀS SUAS PROFUNDAS BASES RELIGIOSAS”. [...] “O orbe, com as suas instituições sociais e políticas, havia atingido um período de grandiosas transformações, que requeriam mais de um século de lutas dolorosas e remissoras, e O ESPIRITISMO SERIA A ESSÊNCIA DESSAS CONQUISTAS NOVAS, reconduzindo os corações ao Evangelho suave do Cristianismo” [13].
E mais:
“O ESPIRITISMO VINHA, desse modo, na hora psicológica das grandes transformações, alentando o espírito humano para que se não perdesse o fruto sagrado de quantos trabalharam e sofreram no esforço penoso da civilização. Com as provas da sobrevivência, VINHA REABILITAR O CRISTIANISMO QUE A IGREJA DETURPARA, SEMEANDO, DE NOVO, OS ETERNOS ENSINAMENTOS DO CRISTO NO CORAÇÃO DOS HOMENS” [14].
“SÓ O ESPIRITISMO pode representar o valor moral onde se encontre o apoio necessário à edificação do porvir” [15].
[...] “SOMENTE O ESPIRITISMO, prescindindo de todas as garantias terrenas, executa o esforço tremendo de manter acesa a luz da crença, nesse barco frágil do homem ignorante do seu glorioso destino, barco que ameaça voltar às correntes da força e da violência, longe das plagas iluminadas da Razão, da Cultura e do Direito” [...] [16].
“O ESPIRITISMO, na sua missão de Consolador, É O AMPARO DO MUNDO neste século de declives da sua História; SÓ ELE PODE, na sua feição de Cristianismo redivivo, salvar as religiões” [...] [17].
Enfim, Chico Xavier não é de forma alguma o “sábio” que valida a coexistência de todas as religiões. Não. Para o médium somente o Espiritismo poderia “salvar” a humanidade.
V.
No seu livro “A Caminho da Luz”, Chico Xavier – para enaltecer o Espiritismo - recorre ao repertório de falsificações e “lendas negras” criado pelos protestantes contra a Santa Igreja Católica [18]. Mas não é só. O médium foi um entusiasta da heresia, do erro e da mentira.
“Os apelos do Alto continuaram a solicitar a atenção da Igreja romana em todas as direções. As chamadas ‘HERESIAS’ brotavam por toda parte onde houvesse CONSCIÊNCIAS LIVRES e CORAÇÕES SINCEROS, mas as autoridades do Catolicismo nunca se mostraram dispostas a receber semelhantes exortações” [19].
A Reforma seria uma espécie de “obra renascentista” de Jesus: [...] “Numerosos precursores da Reforma surgem por toda a parte, combatendo os abusos de natureza religiosa”. [...] “JESUS DIRIGE ESSA RENASCENÇA de todas as atividades humanas, definindo a posição dos vários países europeus” [...] [20].
Não é difícil constatar, hoje, que a Reforma instaurou o império da confusão. Para Chico Xavier, contudo, ela foi a “renascença da religião”: “A essas atividades reformadoras não poderia escapar a Igreja, desviada do caminho cristão. O PLANO INVISÍVEL DETERMINA, assim, a vinda ao mundo de numerosos missionários com o objetivo de levar a efeito A RENASCENÇA DA RELIGIÃO, de maneira a REGENERAR os seus relaxados centros de força. Assim, no século XVI, aparecem as figuras veneráveis de Lutero, Calvino, Erasmo, Melanchton e outros vultos notáveis da Reforma, na Europa Central e nos Países Baixos” [21].
Mesmo que inicialmente faça críticas a Lutero, o médium termina por reconhecer a sua “notável importância”: “A verdade, contudo, é que O HUMILDE FILHO de Eisleben tornara-se órgão da repulsa geral aos abusos da Igreja, no capítulo da imposição dogmática e da extorsão pecuniária. Os postulados de Lutero constituíram, antes de tudo, modalidade de combate aos absurdos romanos, sem representarem o caminho ideal para as verdades religiosas. Ao extremismo do abuso, respondia com o extremismo da intolerância, prejudicando a sua própria doutrina. Mas o seu esforço se coroou de NOTÁVEL IMPORTÂNCIA para os caminhos do porvir” [22] [...] “as suas IDEIAS LIBERTÁRIAS acenderam UMA NOVA LUZ, propagando-se com a rapidez de um incêndio”. [...] “Numerosos camponeses, empolgados pelos DIREITOS DO PENSAMENTO LIVRE, iniciaram grande campanha contra a Igreja usurpadora” [...] [23].
REFERÊNCIAS.
[1]. CIC 2115-2117; Catecismo Maior de São Pio X, 366.
[2]. “A Caminho da Luz”. História da Civilização à Luz do Espiritismo. Federação Espírita do Brasil: Rio de Janeiro, 1996 [Texto supostamente “ditado” pelo espírito “Emmanuel” entre os dias 17 de agosto e 21 de setembro de 1938].
[3]. idem. pp. 127; 128.
[4]. idem. p. 11.
[6]. Edição de referência para as páginas citadas: “A Caminho da Luz”. História da Civilização à Luz do Espiritismo. Federação Espírita do Brasil: Rio de Janeiro, 1996 [Texto supostamente “ditado” pelo espírito “Emmanuel” entre os dias 17 de agosto e 21 de setembro de 1938].
[8]. Cf. idem. Leia também: [https://bit.ly/3ePwwka].
[9]. Edição de referência para as páginas citadas: “A Caminho da Luz”. História da Civilização à Luz do Espiritismo. Federação Espírita do Brasil: Rio de Janeiro, 1996. pp. 193-194.
[10]. Idem. pp. 197-198.
[13]. Edição de referência para as páginas citadas: “A Caminho da Luz”. História da Civilização à Luz do Espiritismo. Federação Espírita do Brasil: Rio de Janeiro, 1996. pp. 199-200.
[14]. Idem. p. 205.
[15]. Idem. p. 205.
[16]. Idem. p. 210.
[17]. Idem. p. 212.
[18]. Cf. “Confrontando sectários importantes”, Rodney Stark. Tradução. Bruno Braga [https://b-braga.blogspot.com/2016/06/confrontando-sectarios-importantes.html].
[19]. Edição de referência para as páginas citadas: “A Caminho da Luz”. História da Civilização à Luz do Espiritismo. Federação Espírita do Brasil: Rio de Janeiro, 1996. p. 159.
[20]. p. 172.
[21]. p. 175.
[22]. p. 176.
[23]. p. 178.

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