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Wednesday, February 22, 2012

Fato consumado.

Bruno Braga.


Um personagem que já frequentou algumas vezes este espaço é assunto novamente - Dimas Enéas. Na última semana, uma mensagem redigida por ele, e com o carimbo de uma foto na qual estampa um largo sorriso, circulou pela internet. Nela Dimas pede ajuda ao destinatário – que teve sua identidade preservada – para a contratação de um funcionário para o Departamento de Comunicação da Prefeitura Municipal de Barbacena. Para que fosse admitido, o candidato ao posto teria que cumprir uma exigência extravagante: além do pré-requisito fundamental para a função – “escrever bem” – ele deveria ser “politicamente articulado e do nosso campo político” (PT-PMDB) [1].

O privilégio concedido a aliados é uma prática comum para os que detêm o poder político – no entanto, é um hábito oculto, por ser absolutamente censurável. No caso em tela, o que causou escândalo, e uma série de manifestações e críticas, foi determinar e tornar público, sem qualquer constrangimento, pudor ou embaraço, uma exigência partidário-político-ideológico para uma função técnica. Embora esta mensagem possa ter implicações jurídicas e legais, repercussão no plano político e eleitoral, ela poderia ser examinada sob o ponto de vista intelectual e cultural.

Por uma destas ironias do acaso, o primeiro artigo de Dimas Enéas que comentei tinha o título “Barbacena e sua encruzilhada” [2]. O estimulo para redigir aquele comentário surgiu das observações sobre o artigo feitas por outros leitores, que elogiavam a isenção da análise do autor e sugeriam, inclusive, a sua candidatura a um posto público na cidade. Valendo-me de critérios objetivos, rastreando a formação e a orientação ideológica de Dimas Enéas, a sua posição no tabuleiro do jogo político, esforcei-me para esclarecer que a alegada “imparcialidade” do articulista era apenas uma maquiagem que escondia objetivos e interesses – e que não era necessário que Dimas ocupasse um cargo de autoridade política, porque no tabuleiro do jogo ele já era um agente político enquanto “Intelectual” (Cf. Anexo, que traz a reprodução integral das minhas observações).

Depois que a minha análise foi postada, alguns leitores se manifestaram. Fui chamado de “ultrapassado”, “antigo”, “preconceituoso”, “ciumento”, “invejoso”, “hipócrita” – alguém que discursa com “ódio”, “rancor”. Houve quem afirmasse que sou destas pessoas que “ficam o tempo todo vendo chifre em cabeça de macaco” – por causa das críticas feitas aos “revolucionários”, sobretudo aos Socialistas-comunistas. Aconteceu, também, que o segundo comentário que redigi, no qual me dispus a esclarecer alguns pontos controversos, e contestar as críticas às minhas primeiras considerações, não foi postado pelo Conselho Editorial do portal “Barbacena Online”, encarregado da análise prévia dos textos, antes de publicá-los [3].

Não – este relato não é uma lamentação: ele é apenas a exposição do percurso de um esforço de compreensão dos fatos, e da confirmação dos seus termos pela divulgação da comprometedora mensagem de Dimas Enéas. Simultaneamente este desdobramento revela algo preocupante sobre os envolvidos: eles se afastaram do pressuposto fundamental de suas atividades, a busca da Verdade, o esforço sério e honesto pelo conhecimento. Este elemento aparece corrompido em um agente político que assina artigos como “cientista”; em um portal de notícias que deveria estar comprometido com a informação e livre expressão do leitor, mas que filtra seus comentários. E, mesmo os leitores merecem a denúncia, porque com desprezo pelo esforço intelectual, incapazes de reconhecer uma análise objetiva dos fatos, preferem aquilo que acolhe os seus sentimentos e carências - por isso eles são encantados por discursos que reivindicam a “democratização”, a “socialização”, a “liberdade de imprensa” e “revolução das mídias sociais”, proferidos pelos mesmos que exigem para a contratação de um jornalista, que o candidato ao posto seja “politicamente articulado e do nosso campo político (PT-PMDB)” [Dimas Enéas].

Depois de um ano do primeiro comentário (Cf. Anexo), a análise nele contida está consumada. Mas, quantos virão a público para assumir a sua responsabilidade? Quem reconhecerá o seu erro, o seu equívoco? Quantos admitirão que privilegiaram a sua artificial reputação de “bom moço”, de pretenso “defensor dos pobres e oprimidos”, da “liberdade” e da “democracia”, em detrimento da discussão objetiva, do conhecimento e da busca da Verdade? Não – não é para mim que precisam prestar contas, nem reconhecer o acerto da minha análise política – mas, sim, para o público com o qual dizem estar comprometidos.  


(*) Nota.

Entrei em contato com Dimas Enéias para que ele pudesse esclarecer os fatos. Em e-mail enviado em 18 de Fevereiro de 2012, ele explicou que não ocupa cargo de confiança ou comissionado na Prefeitura de Barbacena, e que não é membro da Executiva do PT na cidade – disse, sim, que é membro do Diretório do partido na cidade, e que participa das “discussões e articulações políticas há décadas”. Ele acrescenta que não havia a intenção de “arranjar emprego público para X ou Y”, atender “apadrinhamentos” ou “clientelismo” – embora considere que não poderia indicar para o trabalho alguém que estivesse afinado ao campo político da oposição (PSDB), porque o profissional deveria atuar junto às mídias sociais respondendo as questões postas sobre a atual gestão pública municipal. Dimas acrescenta que apenas atendia a um pedido de uma amiga, responsável pelo setor de comunicação da Prefeitura de Barbacena: contratar um jornalista para atuar na área das mídias sociais.  

Acrescento que este espaço está aberto a qualquer um dos interessados que pretenda esclarecer a questão.


Referências.

[1]. O que aparece entre aspas são as palavras do próprio Dimas.

[2]. O artigo pode ser acessado no link [http://www.barbacenaonline.com.br/noticias.php?c=5451&inf=11]. No entanto, aqui ele aparece “higienizado”: com a reformulação do portal “Barbacena Online”, os comentários dos leitores foram abolidos. Portanto, a minha referência é uma cópia de segurança da antiga publicação.

[3]. Este segundo comentário foi publicado neste blog com o título “Dois comentário” [http://dershatten.blogspot.com/2011/03/dois-comentarios.html].


[Anexo]

. Primeiro comentário sobre o artigo “Barbacena e sua encruzilhada”, de Dimas Enéas Soares Ferreira.

Seria pertinente fazer duas observações, fundadas não apenas no texto de Dimas E. Ferreira, mas também nos comentários subseqüentes.

A primeira diz respeito à alegada “imparcialidade” do autor em seu artigo. Dimas não abre mão de suas convicções político-partidárias – a esquerda social-comunista, representada pelo PT. Se o autor não o faz diretamente como em textos anteriores, trata, neste, de velar, ocultar, ou higienizar seu direcionamento político. De qualquer maneira é possível identificá-lo na dissertação apresentada. O autor faz uso de um vocabulário próprio do esquerdismo; é o caso, por exemplo, da aplicação do termo “elite”, sobretudo associado a “elite empresarial”. A partir desta visão estereotipada traça uma “narrativa histórica” para justificar toda sua “engenharia social”, materializada em propostas político-sociais. Se em um momento Dimas acena com uma surpreendente “parceria” entre o “mercado” e o poder público, para mitigar o seu enérgico esquerdismo de outrora, é preciso lembrar que o próprio Marx observa o Capitalismo como uma etapa fundamental para o projeto Socialista-Comunista, porém um Capital de “potência social” (MARX, “Manifesto do Partido Comunista”, 2002, p. 61). Esta “potência social”, justamente a proposta do autor do artigo, significa a aplicação do capital em duas frentes: não apenas na esfera dita “social”, mas no fortalecimento da estrutura do poder, quer dizer, do próprio partido que rege e orienta as políticas públicas.

Outra consideração que aponta a “parcialidade” de Dimas Ferreira é a sua proposta para dissolver uma pretensa estrutura “classista” (mais uma vez o vocabulário e a leitura histórica marxista: “A história de todas as sociedades que existiram até hoje é a história da [luta de classes]”, MARX, 2002, p. 45). Para isso oferece o “multiculturalismo”, com um propósito aparentemente absurdo: instaurar uma “democracia” fundada na “diferença”, quer dizer, estabelecendo “diferenças étnicas, culturais, de opção sexual, de crença, etc” (nas próprias palavras do autor) – um programa nítido de “discriminação reversa”, no tratamento “diferenciado” de tais minorias. Acontece que, se este propósito absurdo fere o bom senso, é completamente justificável do ponto de vista da “estratégia esquerdista”. Existe, por parte da esquerda, um imenso esforço para “construir novas minorias”, estabelecidas por diferenças muitas vezes “forjadas” e “artificiais”. Contudo, este é um esforço recompensado pela realização do projeto, que facilita as manobras do poder político, já que transforma as “minorias” em “grupos de pressão”, e as suas lideranças, conseqüentemente, em agentes políticos. Nestes termos, os grupos e suas respectivas lideranças passam a contribuir com a grande força, e o diferencial, da esquerda, a “militância” – porque manifestações, protestos, e, principalmente, reivindicações, não são feitos por cidadãos comuns, que resolvem sair de suas casas para ocupar praças públicas, mas sim por entidades, por grupos organizados, que orientam toda a ação. Assim, para o espectador desatento, estas manifestações podem parecer a “voz do povo”, quando na verdade são os anseios de um grupo, ou de um Partido (Cf. Ernesto Laclau & Chantal Mouffe. Hegemony & Socialist Strategy: Towards a Radical Democratic Politics).

A segunda observação a ser feita refere-se à atuação política do autor do artigo, discutida em alguns comentários anteriores. Além de diretor do Sinpro Minas e professor da Epcar e da Unipac (“Nota da Redação”), Dimas, como informa [x] (08.02.2011), foi dirigente da CUT Zona da Mata, membro do Conselho Municipal de Educação, e é membro do PT, Partido dos Trabalhadores. Através destas atividades Dimas já exerce um papel político, e de grande influência – ele não necessita de um mandato político, porque atua em uma esfera de importância fundamental, a esfera cultural. Desde que Antonio Gramsci se tornou o guru do Social-Comunismo, e do esquerdismo, o “intelectual orgânico” passou a desempenhar um papel imprescindível para a tomada e para a manutenção do poder – comprometido com o partido, ele não visa a “verdade objetiva”, mas atua como agente de influência psicológica, na formação das idéias, dos pensamentos, do imaginário das pessoas, modificando hábitos e criando expectativas: é o que o próprio Gramsci chama, de uma forma bastante peculiar, de “senso comum”. Em outras palavras, o “intelectual orgânico” não tem nenhuma preocupação com a compreensão da realidade efetiva, nem com a honestidade intelectual, mas está completamente engajado na defesa dos “interesses do Partido”. Para articular a teoria gramsciana com a questão em tela, basta recordar que, Dimas é articulista, professor Universitário, diretor de sindicato e, sobretudo, membro do “Partido”, do PT.

Então, feitas as devidas observações, Dimas Ferreira não é “imparcial” como foi alegado nos comentários precedentes, e continua, embora neste texto de maneira um pouco mais velada, sua atividade incansável de militante. Poder-se-ia questionar se ele está consciente de toda a estratégia esquerdista, definida nos bastidores pelo alto escalão do Partido – no entanto, a julgar por suas credenciais, é difícil acreditar que Dimas seja apenas um “Polieznyi”, termo utilizado por Lênin para referir-se aos “intelectuais ocidentais”.

Bruno Braga – Barbacena – Publicado no portal “Barbacena Online” em 11 de Fevereiro de 2011 [11:09:51].

 

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