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Sunday, September 23, 2012

Che, bem na foto.



Bruno Braga.



A chamada de uma notícia despertou imediatamente a minha curiosidade: a filha de Che Guevara luta para preservar a imagem de revolucionário idealista do pai [1]. Enfim, imaginava eu, a selvageria, as brutalidades e os fuzilamentos promovidos pelo revolucionário estavam ganhando dimensão pública e, por isso, sua filha estaria empenhada em justificar todos estes horrores.  

Tão logo bato os olhos nas primeiras linhas do texto, leio que o tormento da Srta. Guevara não era bem esse: ela está indignada, sobretudo, com a utilização da imagem do pai em estampas de biquines e em rótulos de garrafas de vodka. É um absurdo, pensa ela, que a foto de Che, um abstêmio, seja um chamativo para bebida alcoólica. Porém, a Srta. Guevara não percebe uma contradição ainda mais radical: a utilização da imagem de um assassino covarde como símbolo da justiça, da igualdade e da liberdade. Esta inversão, que publicamente não sofre qualquer ameaça, é a imagem que a filha pretende conservar.  

Como filha, a Srta. Che cria um falso pretexto para lutar contra empresas de biquine e de vodka. Como mãe, Rosa Hernández lutou verdadeiramente pela vida do filho adolescente, condenado sumariamente ao fuzilamento no paredão. Rosa implorou diretamente ao pai da Srta. Che, ao próprio Che Guevara, que a recebeu para uma entrevista depois de muita insistência. Cordial e solicito, o revolucionário acomodou Rosa Hernández. Ele ouviu atenciosamente o apelo, assistiu ao desespero daquela mãe. Então, tomou o telefone sobre a sua mesa e proferiu a sentença com o amor e com a compaixão que esconde a foto de Alberto Corda: “Executem o jovem Hernández essa noite”. Aos gritos, Rosa foi arrancada do gabinete do justiceiro revolucionário [2].    

A Srta. Guevara justifica a violência e os cadáveres produzidos pela revolução com a própria natureza do processo: “Numa verdadeira revolução, você precisa conseguir o que quer pela força. Um inimigo que não quer lhe dar o que você quer? Talvez você tenha que tomar” [3]. Estas palavras ecoam o pronunciamento do pai em 1960: “A fim de conquistar alguma coisa temos que tirá-la de alguém” [4].

Depois de ler a notícia, vejo que a Srta. Guevara herdou do pai não apenas o nome, mas também a perturbação mental. E é esta perturbação que ela pretende preservar criando um falso inimigo em estampas de biquines e em rótulos de vodka. Enquanto isso, ela fortalece uma imagem que permanece intacta na cultura em geral, e ainda serve como objeto de um culto macabro: o “culto a ‘El Chancho’” [5]. 


Referências.


[2]. FONTOVA, 2009, p. 140.

[3]. Cf. Ref. [1].

[4]. FONTOVA, 2009, p. 187.

[5]. BRAGA, Bruno. “Culto a ‘El Chancho’” [http://dershatten.blogspot.com.br/2011/09/culto-el-chancho_01.html].

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