Mais três comentários.
Bruno Braga.
Na última postagem (15 de Março de 2011) disponibilizei dois "comentários" enviados para o site "Barbacena Online" (www.barbacenaonline.com.br) que continham observações sobre determinados textos publicados no canal. O Conselho Editorial do referido site, no entanto, encarregado de um exame prévio das manifestações dos leitores, decidiu por não dar-lhes publicidade. Aos "dois comentários" anteriores somam-se agora "mais três", que também aqui decido estampar, já que, após insistente pedido de esclarecimento sobre a fundamentação destas novas "filtragens", não houve nenhum retorno por parte dos responsáveis.
A seguir os comentários - textos em itálico, na versão original enviada para o site "Barbacena Online" - com as respectivas referências.
I. Bruno Braga. Comentário referente à notícia "'A cor da cultura' entra em nova etapa" [http://www.barbacenaonline.com.br/noticias.php?c=5612&inf=100].
Cara Maria Eneida,
Antes desta "formação continuada", pela qual passam professores e técnicos em educação, seria pertinente que estes profissionais se inteirassem sobre o projeto maior, do qual "A cor da cultura" é apenas um dos seus braços. Assim constatariam que propostas deste tipo trazem consigo: a elaboração de uma narrativa, reduzida e distorcida, da História; a introdução na cultura da "consciência da "raça"", que fere lições básicas de genética; a instauração da bipolaridade entre "negros" e "brancos", desprezando os "pardos" ("mestiços") – estes que são quase metade da população e assim se auto-declaram como não possuindo raça nenhuma, ou seja, não se consideram nem negros nem brancos, mas uma "mistura" [Cf. http://noticias.uol.com.br/especiais/pnad/2010/ultimas-noticias/2010/09/08/cresce-proporcao-de-pardos-e-pretos-no-pais-brancos-amarelos-e-indigenas-perdem-espaco.jhtm?action=print]; uma interpretação equivocada do "princípio de igualdade", que objetiva estabelecer a igualdade através da "diferença"; manipulações políticas e inclusive legislativas (Cf. Lei 12.288/2010 – Estatuto da Igualdade Racial – Exemplo: Considerar a pessoa que se auto-declara "parda" como parte da população negra [Art. 1, IV]).
Agora, uma observação importante, criticar projetos deste tipo não significa adotar a posição contrária, a do Racismo. Pelo contrário, pretendo indicar que, para amparar os mais necessitados não é preciso recorrer à diferença da "cor da pele", nem à ancestralidade: basta considerar que eles são simplesmente seres humanos.
Grande abraço.
Bruno Braga.
Barbacena, 14 de Março de 2011.
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II. Bruno Braga. Comentário a respeito do texto de Geraldo Trindade intitulado "O que está acontecendo no mundo?" [http://www.barbacenaonline.com.br/noticias.php?c=5733&inf=100].
Caro Geraldo Trindade,
Em sua dissertação você simplifica os eventos ocorridos no mundo árabe. Isto é um equívoco na medida em que se coloca ocorrências que têm motivações distintas em um mesmo plano – como você faz com os eventos da Líbia e do Egito. Este equívoco metodológico – ou por desconhecimento de causa – tem conseqüências desastrosas, sendo uma delas a afirmação de que os manifestantes "não pertencem nem defendem as tradições nacionalistas, de um estado árabe e teocrático". Ora, no caso específico do Egito quem articula protestos, manifestações, e age como protagonista da oposição política é a Irmandade Muçulmana – uma entidade de origem obscura, que já esteve associada com o Nazismo, que está intimamente ligada a organizações terroristas (Hamas) [Cf. Jim Mars e Peter Levanda], e tem compromisso radical com a instauração do "Califado Universal". Neste caso não é o "povo", ou a "grande massa", que protesta e realiza manifestações – trata-se de certo número de pessoas que funciona como "grupo de pressão" em favor dos interesses de uma entidade muito bem organizada.
Além disso, apresentar os árabes como povo "explorado" e "dócil" a governos ditatoriais é reduzir uma história – repleta de conflitos religiosos, batalhas contra ocupações estrangeiras, lutas de independência, movimentos libertários, guerras de invasão, ocupação e dominação na Ásia, África e Europa, e até exploração do trabalho escravo (Cf. MAGNOLI, p. 196) – para criar estereótipos panfletários ou idealizações políticas.
Grande abraço.
Bruno Braga.
http://dershatten.blogspot.com/
Belo Horizonte, 20 de Março de 2011.
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III. Bruno Braga. Comentário sobre o texto de Dimas E. Soares Ferreira, "Ensaio crítico sobre a corrupção: teoria, percepção e realidade" [http://www.barbacenaonline.com.br/noticias.php?c=5740&inf=100].
Caro Dimas,
Em seu texto você aponta o responsável pelos "desvios éticos": as ambições e a ganância das sociedades humanas. No entanto, as "sociedades" não são ambiciosas ou gananciosas, pois as "sociedades" não têm realidade efetiva, mas somente os "indivíduos" que a compõem – estes sim são ambiciosos, gananciosos, e responsáveis por "desvios éticos". É assim porque "sociedade" é uma abstração, é um "universal" que não tem existência própria senão na "substância primeira" que a corporifica, ou seja, em cada um dos homens que dela faz parte – o indivíduo concreto, portador de sentimentos e paixões, e capaz de agir. Ademais, falta à "sociedade" a unidade de intenções e autoconsciência – pré-requisito necessário para a ação e, conseqüentemente, para a culpabilidade, isto é, para ser responsabilizado por "desvios éticos".
Sobre o levantamento histórico e teórico que você estabelece ao longo do texto poder-se-ia fazer algumas observações – selecionei duas.
A primeira diz respeito à consideração da política e do pensamento grego. Você utiliza uma chave interpretativa que não se aplica, de maneira nenhuma, àquele período – a da velha e conhecida "luta de classes", recorrendo ao vocabulário, "oligarquia", "povo", etc.. É pertinente apontar o equívoco de se aplicar esta chave interpretativa porque ela contamina a sua utilização do termo "democracia" – que no mundo grego tinha um significado bem peculiar, muito diferente das suas pretensões. Por exemplo, a democracia grega não atingia os "escravos", que eram, em Atenas, 3/5 da população e não tinham qualquer direito político (DURANT, 2000, p. 31). Nestes termos, a sua consideração, feita sob a luta entre "oligarquia" e "povo" não se sustenta.
A segunda observação se refere à incapacidade dos liberais, alegada por você, de explicar "os índices altíssimos de corrupção registrados na Rússia logo após sua opção pelo modelo liberal quando se deu um intenso processo de privatizações e desregulamentações". Para explicar o fato – sem vincular-me a nenhuma corrente teórica ou política – basta recorrer às considerações feitas anteriormente: não são os modelos políticos os culpados, os responsáveis pela "corrupção", mas os "indivíduos concretos", efetivos, que se utilizam deles enquanto "instrumento" para a realização de suas "ambições" pessoais, ou as do seu grupo – formando, por sua vez, por indivíduos concretos que compartilham os mesmos interesses. Nestes termos, quais são, em sua maior parte, os indivíduos que permaneceram após a derrocada do socialismo soviético? A própria elite burocrática do modelo de Estado antigo. Ou você pensa que, abandonado o socialismo soviético, toda a elite burocrática, membros do partido, comandantes militares, e agentes da KGB, voltaram para suas casas, para cuidar da família e do cachorro? Não. E cito apenas um exemplo de que estes mesmos permanecem no poder: Vladmir Putin, filho de um ex-agente da NKVD (antiga KGB [Sobre o orçamento e as atividades da KGB, Cf. COURTOIS, 1998; "Conversation with Yuri Bezmenov" – Video]). A questão está, então, explicada.
É isso, Dimas. Outros pontos do seu texto poderiam ser discutidos – mas, estes me pareceram os mais pertinentes para uma primeira consideração.
Cordialmente,
Bruno Braga.
http://dershatten.blogspot.com/
Belo Horizonte, 20 de Março de 2011.