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Tuesday, January 31, 2012

Quem é Raúl Castro?

Bruno Braga.




 
Em 2006, em meio às dúvidas e especulações sobre o estado de saúde do “Comandante” cubano, e principalmente com a indicação de que ele transferiria seu poder para o incógnito, mas supostamente “moderado”, irmão, Ion Mihai Pacepa se esforçou para livrar o público da incerteza: “Quem é Raúl Castro?”
 
Pacepa foi um graduado oficial do serviço de inteligência romeno durante o governo do presidente comunista Nocolae Ceausescu. Antes de se tornar um desertor, e receber abrigo nos Estados Unidos, ele conheceu de perto o irmão de Fidel Castro. Por conta das conexões e colaborações estabelecidas entre os regimes comunistas, Pacepa e Raúl não só trabalharam juntos, mas também pescaram, mergulharam - travaram uma disputa em um campo de tiros; dirigiram automóveis idênticos, um Alfa Romeo. Durante este período de convivência e trabalho conjunto, Pacepa assegura que não há nenhum traço em Raúl Castro que sugira uma espécie de “democratização” em Cuba.
 
Raúl sustentava a insígnia oficial de “Maximum General”. Enquanto seu irmão, Fidel, era a figura pública, proferindo longos e inflamados discursos, Raúl dirigia a economia cubana – cuidava da política internacional da Ilha, do comércio exterior, do sistema judiciário, das prisões e do turismo; não escapavam do seu domínio nem mesmo os hotéis e praias. Um poder estimulado pela vaidade incrustada na sua personalidade do “Maximum General”, mas também pelo álcool.    
 
O desertor romeno considera que, de fato, Fidel Castro pode ter concebido o regime de terror em Cuba; porém, o seu irmão, Raúl, foi, definitivamente, o “carniceiro”. Raúl foi o chefe de uma das instituições mais criminosas do Comunismo: a polícia política cubana. Ele era cruel e implacável. Colocou em prática as suas habilidades sinistras meses depois da tomada do poder em Cuba: Raúl organizou a execução de centenas de policiais e oficiais militares do regime deposto de Fulgencio Batista – os prisioneiros foram fuzilados e seus corpos enterrados em valas comuns fora de Santiago de Cuba.
 
No poder, os irmãos Castro receberam apoio e financiamento dos Comunistas soviéticos – principalmente para a organização da KGB cubana e para a construção secreta de bases de mísseis na Ilha. Porém, os soviéticos desconfiavam de Fidel Castro, considerado um “aventureiro” que não tinha uma sólida instrução no Marxismo. Já o seu irmão contava com a simpatia e confiança de Khrushchev: ambos eram apaixonados pelo marxismo; detestavam a escola, a religião e a disciplina; consideravam-se especialistas militares; eram obsecados por espionagem e contraespionagem – além de serem grandes apreciadores de Vodka.
 
Em 1972, quando era o braço direito do presidente romeno, Pacepa preparou uma visita oficial de Ceausescu a Havana. Durante o encontro, o presidente romeno e os irmãos Castro estabeleceram uma parceria para investirem no mercado de drogas. Pacepa relata que a intenção era inundar o mundo com drogas, porque “as drogas poderiam causar mais danos ao imperialismo do que as armas nucleares”, pensava Fidel - que recebia o assentimento do seu irmão: “As drogas irão corroer o capitalismo desde dentro”.
 
Os resultados da sociedade parecem ter sido animadores. Pacepa, o encarregado do dinheiro romeno que circulava na administração do sinistro negócio, revela que, quando deixou a Romênia, em 1978, havia na conta chamada “AT-78” por volta de 400 milhões de dólares.
 
Porém, as atividades criminosas dos irmãos Castro não estavam restritas ao comércio de drogas. O serviço de inteligência de Raúl trabalhou para expandir a influência de Cuba na América do Sul e no Terceiro Mundo – com este propósito, envolveu-se com os sandinistas na Nicarágua; fomentou a guerra em El Salvador; colaborou com o “Movimento de Libertação da Angola”; instruiu e assessorou a “Organização para a libertação da Palestina”; cooperou com a Líbia, com Iêmen do Sul, com a “Frente Polisário para a libertação do Saara Ocidental”; auxiliou as “Forças Armadas Revolucionárias Colombianas” (FARC).
 
Depois de expor a sua experiência pessoal, de quem participou efetivamente dos acontecimentos históricos, Pacepa não hesitou em esclarecer a dúvida que hoje é ainda pertinente: “Quem é Raúl Castro?” Embora a imagem do irmão de Fidel seja construída com traços de amabilidade, e com um espírito moderado e democrático, ele o define como “um assassino e terrorista internacional que fez fortuna com a venda ilegal de armas, drogas, e seres humanos”.    

 
(*) Nota. A presidente Dilma Rousseff está em Cuba. A visita oficial é significativa, mostra o sucesso dos estratégicos empreendimentos dos irmãos Castro, que hoje recebem, como a maior autoridade do governo brasileiro, a militância armada que financiaram para reivindicar o poder no passado. Com parceiros mais fortalecidos, o propósito revolucionário é alimentado.   

 
Referências.
 
Ion Mihai Pacepa, “Who is Raúl Castro? A Tyrant only a brother could love” [http://www.nationalreview.com/articles/218444/who-ra-uacute-l-castro/ion-mihai-pacepa]. 


Anexo.

Duas fotos

Friday, January 27, 2012

Sócrates morre outra vez.
Bruno Braga.

 
A Educação no Brasil é péssima. Em todos os exames aos quais é submetida ela é reprovada, nem mesmo o ensino superior escapa. As principais justificativas para esta situação lamentável são a ausência de recursos, investimentos, no ensino e a falta de valorização do professor – ou seja, o problema da educação brasileira é dinheiro.
 
No entanto, é fundamental incluir nesta avaliação a responsabilidade dos próprios educadores. Por exemplo, o impacto e a contribuição para a desgraça da educação no país de práticas como a “pedagogia do oprimido”, a “pedagogia do amor”, o combate de um tal “preconceito linguístico”. O mesmo poderia ser feito sobre o compromisso e a devoção do professor à sua atividade. Porque a avaliação destes elementos não depende de nenhum outro fator, já que sinceridade e honestidade intelectual não custam dinheiro. Um método proveitoso para estabelecer esta aferição é analisar o que os educadores, os professores, e seus representantes ensinam e escrevem.
 
Gilson Reis é presidente do SINDPRO-MG [1] – Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais. É autor de um artigo intitulado “O Deus autoritário” [2], no qual discute as raízes e os desdobramentos da crise financeira na Grécia. Além das análises políticas, econômicas e sociais – passíveis de discussão – neste texto o articulista opõe à divindade onipotente, autoritária e opressora dos novos tempos, o mercado financeiro, um modelo de virtude: o filósofo grego Sócrates.
 
Escreve Gilson, que Sócrates foi condenado à morte, devendo ingerir a cicuta, porque defendia a “radicalização da Democracia” – o filósofo grego “condenava os valores morais e religiosos que orientavam a conduta dos indivíduos e que serviam de base às instituições políticas de seu tempo”. O veredicto que definia a pena capital também era uma punição para aquele que, segundo Gilson, questionava os deuses do Estado.
 
Se um sopro vital permitisse a Sócrates ler o texto de Gilson, provavelmente o filósofo ateniense repetiria as palavras que inauguram o seu discurso de defesa, reproduzido por Platão, diante do Conselho que o julgou: “A mim próprio quase me fizeram esquecer quem sou” [3].
 
Definitivamente, Gilson descreve outra pessoa que não Sócrates – a distorção é tão absurda que o articulista faz o papel, aparentemente sem perceber, dos acusadores do filósofo grego. Porque se o articulista afirma que Sócrates questionava os valores morais e religiosos, que questionava os deuses do Estado, o filósofo grego, há mais de dois mil anos, se defendia destas acusações dizendo justamente o contrário: “é o oposto disto, atenienses, porque eu acredito como nenhum dos meus acusadores e espero de vós e dos deuses que a vossa sentença seja o melhor para mim e para vós” [4] – e não hesita em declarar que “não há para o homem bom, mal algum, quer na vida, quer na morte, e os deuses não descuidam do seu destino” [5].
 
Gilson escreve que Sócrates questionava as “normas de conduta política”. Porém, um episódio da vida do filósofo desmente o articulista. No processo dos dez generais que deixaram de recolher os mortos na batalha naval, havia a intenção de julgar os acusados em bloco – uma medida ilegal. Então Sócrates decididamente se posicionou: “Achei do meu dever correr perigo ao lado da lei e da justiça” [6].
 
O episódio mesmo da condenação de Sócrates desmascara o personagem criado por Gilson. Porque, depois de sentenciado, e aguardando a hora da morte, o filósofo grego rejeita a proposta de fuga lançada por um de seus admiradores, Críton. O filósofo grego alegou que não pretendia ser um “adúltero das leis”, porque, fugindo, ele destruiria as próprias leis e, consequentemente, o Estado [7]. Sócrates concorda com as Leis da República, com quem trava um diálogo imaginário: “Sócrates, o que vais fazer? Executar teu plano não significa aniquilar-nos completamente, sendo que de ti dependem as leis da República e as de todo o Estado? Acreditas que um Estado pode subsistir se as suas sentenças legais não têm poder e, o que é mais grave, se os indivíduos as desprezam e aniquilam?” [8].
 
Gilson não descreve as ideias e o comportamento de Sócrates – atribui ainda, sem reticências, a sentença lapidar de Protágoras ao filósofo ateniense: “O homem é a medida de todas as coisas”. Enfim, o articulista conta o oposto daquilo que o próprio Sócrates dizia e fazia – se acreditava estar elogiando Sócrates, Gilson acaba ocupando o papel dos acusadores do filósofo. Mas é preciso perguntar: será que Gilson leu os relatos sobre Sócrates? Ou será que o articulista segue os métodos do seu grande mestre, a quem louva no final do seu texto? Pois, no caso desta última hipótese, tudo estaria explicado, já que Karl Marx foi um grande falsificador de discursos, documentos, um promotor de distorções históricas para fundamentar suas teses preconcebidas [9].
 
Uma das condutas que estimulou a calúnia contra Sócrates foi o fato de o filósofo ter abordado os sábios de sua época – o político, o poeta e o artífice – para verificar a sentença do oráculo de Delfos que o declarou como o mais sábio de Atenas. Ele realmente comprovou a sentença da pitonisa, porque aqueles que publicamente eram considerados sábios acreditavam conhecer, mas nada sabiam – Sócrates, por sua vez, sabia pelo menos uma coisa: que nada sabia. Embora as consequências da sua busca tenham sido trágicas e funestas, o episódio deixa uma lição socrática hoje pertinente: questionar o compromisso e a honestidade intelectual dos professores, dos educadores e seus representantes, sobretudo quando eles reivindicam para si o poder de “transformar o mundo” – porque esta não é uma questão de dinheiro, e não há nada que os absolva da responsabilidade de contribuir para situação deplorável da educação no Brasil.
 
 
Referências.
 
[3]. PLATÃO. Apologia de Sócrates. Editora Nova Cultural: São Paulo, 2004. Coleção Os Pensadores – Vol. Sócrates. p. 39.
 
[4]. Idem, p. 64.
 
[5]. Idem, p. 73.
 
[6]. Idem, p. 60.
 
[7]. PLATÃO. Críton. Editora Nova Cultural: São Paulo, 2000. Coleção Os Pensadores – Vol. Platão. p. 112.
 
[8]. Idem, p. 109.
 
[9]. Cf. BRAGA, Bruno. “Entre o Mestre e o ‘Intelectual’” [http://dershatten.blogspot.com/2011/06/entre-o-mestre-e-o-intelectual.html].

Tuesday, January 24, 2012

Quem se lembra do velho Clô?

Bruno Braga.

 

Na novela “Fina Estampa”, da Rede Globo, Marcelo Serrado interpreta Crodoaldo Valério. “Crô” - para os íntimos - é um mordomo gay que muito tem contribuído para os índices de audiência da trama. O hipocorístico do nome do personagem, com a troca de uma das letras, remete a uma personalidade homossexual também bastante popular: o falecido Clodovil Hernandes – o velho “Clô”. A associação, no entanto, já não parece tão evidente: não se sabe se por uma consequência do tempo, ou por um propósito não declarado abertamente.
 
Em favor desta última hipótese, uma de declaração do Deputado Federal e líder do movimento LGBT, Jean Wyllys, pode lançar alguma pista:
 
Antes de mim, teve o Clodovil [Hernandes] (...) Mas ele não encampava a luta do movimento, pelo contrário. Em entrevistas, era radicalmente contra as paradas gays (...) O Deputado Clodovil não oferecia perigo, compreendeu? O problema é chegar aqui e reclamar por direito. [1]
 
A consideração do porta-voz do movimento gay é apenas o rastro a ser seguido para constatar que a diferença com velho Clô não era apenas de “adesão à causa”. Um registro do lançamento da “Frente Parlamentar pela livre expressão sexual”, realizado no Congresso Nacional em 2007 [2], revela divergências mais profundas. Nele Clodovil aparece discursando para a militância gayzista:
 
Eu daria um viva à vida, que seria muito melhor que um viva a qualquer causa (...) Nenhum de nós teria nascido se não houvesse a mãe; então, eu não sei o porquê desta luta – para provar o quê se nós somos filhos de heterossexuais? (...) Isto não é liberdade, está se transformando em libertinagem (...) Esta Parada Gay, eu nunca iria a ela (...) Eu não tenho orgulho nenhum de ser gay, eu tenho orgulho de ser quem eu sou (...) Eu sou a favor da família. Eu acho que eu nasci de um homem normal e de uma mulher normal (...) Eu acredito em Deus. [Os destaques são meus].
 
Enquanto discursava Clodovil era vaiado – e debaixo dos brados de palavras de ordem, abandonou o microfone: “Não adianta, não adianta, realmente (...) vocês sempre entenderão da maneira que convêm a vocês”.
 
Fica claro que as divergências entre Clodovil e o movimento gay – e consequente com um de seus líderes, Jean Wyllys - não esta somente na adesão a “uma causa”, na defesa de uma “bandeira”. Como a militância gayzista é um dos braços do movimento revolucionário, eles têm alguns princípios em comum: atingir a “família tradicional” e a “religião”. No meio da confusão dos protestos e reivindicações a herança do profético manifesto revolucionário marxista - contra a “família burguesa”; contra o “ópio do povo”, a religião - torna-se cada vez mais velada. 
 
Se não é possível destruí-las completamente, é necessário reformular tanto a “família tradicional” quanto a “religião”. No Brasil a primeira já foi atingida com os artifícios e subterfúgios da decisão do Supremo Tribunal Federal que reconhece a união homoafetivo como entidade familiar [3]. Quanto à religião, apesar dos insucessos das investidas mais audaciosas – como a do temporariamente suspenso PL-122 -, alguns resultados podem ser constatados – por exemplo, as transformações pelas quais passaram os santos da Igreja Católica na Parada Gay de 2011:
 
 

Em tempos de “transformações”, até mesmo o ator que interpreta o personagem “Crô” é constrangido pelos absurdos e confusões mentais provocados pelas investidas revolucionárias. Hesitante, reforçando o apoio à união homoafetiva e a políticas gayzistas, o ator Marcelo Serrado comete um pecado contra o decálogo “politicamente correto”: ele afirma que não gostaria que sua filha de 7 anos assistisse a um “beijo gay” em uma novela [4]. A patrulha do movimento revolucionário não tardou na censura e crítica – porque para a “transformação do mundo” não pode restar nada daquilo que mesmo o velho, e esquecido, Clô, com suas extravagâncias e afetações, sabia ser fundamental.

 
Referências.
 
[1]. Jean Wyllys em entrevista para a revista “Rolling Stone” [http://www.rollingstone.com.br/edicao/59/a-cruzada-libertadora-de-jean-wyllys]. 
 
[3]. Cf. BRAGA, Bruno. “Família do ‘Novo Milênio’?” [http://b-braga.blogspot.com.br/2011/08/familia-do-novo-milenio-bruno-braga.html].
 
[4]. Cf. Jornal “Folha de São Paulo”, 08 de Janeiro de 2012.

Thursday, January 19, 2012

A consagração de um ateísta militante.  
Bruno Braga.

 

Em um debate promovido pela “Intelligence Squared”, em 2007 [1], o célebre ateísta Richard Dawkins rebateu enfaticamente um de seus oponentes, Nigel Spivey, que apontou a religiosidade como parte da natureza humana: “Fale por você mesmo! Ela não é parte de mim, e não é parte da grande maioria dos meus amigos nas Universidades da Inglaterra, dos Estados Unidos e de outros lugares”.
 
Dawkins reproduz uma concepção, hoje, muito comum, a de que a Universidade é o templo da razão e da sabedoria, e todos os seus sacerdotes e discípulos devem ser batizados e purificados da mácula da religião. Acontece que, se a religião não faz parte da natureza da casta de Dawkins, ela está na origem do templo dos “iluminados”, dos adoradores da “verdade científica”. Porque foi a “Idade das Trevas”, condenada pelo professor e seus asseclas, que erigiu o púlpito de onde eles mesmos agora cantam suas glórias – uma dívida composta não apenas por muros, pedras, mas uma dívida intelectual: pois os religiosos de ontem, monges e árabes, preservaram e traduziram textos da antiguidade fundamentais para a composição da estrutura do conhecimento que serve de base para a ciência contemporânea. E se o recuo no tempo for ainda mais distante, na Grécia Antiga o cultivo do pensamento racional esteve intimamente articulado com a religiosidade.
 
Para que os débitos dos acadêmicos não sejam anotados apenas nas contas do passado, é preciso reconhecer a produção contemporânea de um centro de estudo em especial, com o mérito do prêmio Nobel: a Pontificia Academia Scientiarum – a academia científica do Vaticano [2].
 
Toda esta herança, que compõe o fundamento da civilização Ocidental, é produto de um surto psicótico, de um delírio? É uma ilusão provocada pelo fanatismo? Não pode ser o resultado de uma busca sincera que, embora situada em um horizonte mais amplo, é semelhante à de um biólogo que honestamente investiga a natureza em seu projeto de pesquisa? Não – pelo menos para Dawkins, que considera o dinheiro a grande fonte de inspiração: o maior móbile dos artistas financiados pelas ordens confessionais e responsáveis pela capela do King’s College e pela Capela Sistina. Se Dawkins está aqui sendo coerente com a sua redução materialista, então a sua honestidade intelectual também é colocada sob a suspeita das multimilionárias verbas de pesquisa universitária.
 
Certo é que Dawkins combate apenas uma caricatura da religião, criada para que ele não precise de grandes esforços para derrubá-la e depois, com ares de superioridade, alardear a vitória. Este não é um expediente inocente, está abertamente declarado em seu best seller “Deus, um delírio” [3], onde afirma que não é necessário conhecer o pensamento dos eruditos confessionais para criticar a religião. Se Dawkins dispensa o pensamento dos sábios e doutores religiosos – e se não investiga o que é a experiência, a vida religiosa – então o seu próprio papel de debatedor é colocado em questão: ele não estaria qualificado para discutir a marca da religiosidade na natureza humana porque ele simplesmente não sabe o que é religião. No entanto, os seus colegas universitários o aplaudem, grande parte da classe supostamente letrada o louva, e os formadores de opinião o enaltecem. Eles, que ditam os termos do debate público, expressam algo sintomático e preocupante: a degradação não só do sentido de religião, mas também a do significado de conhecimento – assim, constroem um novo templo, e no altar da Universidade consagram um verdadeiro vigarista.

 
Referências.
 
[1] Intelligence Squared. “We would be better of without religion”, 2007 [http://www.intelligencesquared.com/events/wed-be-better-off-without-religion].
 

Thursday, January 12, 2012

Revolução "colorida".

Bruno Braga.

 
A declaração de Frei Betto reproduzida no artigo “Surto infausto” revela uma preocupação constante de um dos braços do movimento revolucionário: “Reinventar o Socialismo” [1]. Estas reinvenções já eram promovidas desde Stálin, que, enquanto definia para os soviéticos “o socialismo em um único país”, simultaneamente patrocinava os movimentos nacionalistas e a revolução cultural pelo mundo. Com a sofisticação das estratégias, Ernesto Laclau é um exemplo contemporâneo para aqueles que ainda pensam a partir de estereótipos e caricaturas, demonstrando que a subversão não se dá apenas por meio insurrecional, mas se infiltra até mesmo na linguagem, com a resignificação do vocabulário [2]. Porque o que importa para o processo revolucionário não é o conteúdo das suas propostas, mas a constante elaboração de mecanismos de concentração de poder. Assim, alguns membros da brigada “inimiga” são integrados ao movimento – como os capitalistas “aliados” -, e parte dos perseguidos de outrora são absorvidos e cooptados.
 
Uma das mais recentes e destacadas frentes do movimento revolucionário aparece perfeitamente caracterizada por um de seus líderes. Ele, que não esconde suas influências, tem uma filiação político-partidária sugestiva - Partido Socialismo e Liberdade. Além disso, discursa no mesmo tom do ilustre “Comandante”:
 
                          “Eu sei que já escrevi o meu nome na história [...]” [3].

 

O verniz de palavras de justiça e igualdade para a sua “minoria”, o brado afetado e histérico contra o preconceito e a discriminação, escondem o ardil, os artifícios, e os falsos pretextos, para a construção do “mundo maravilhoso” e “colorido” – que para ser realizado implica a desconstrução deste mundo mesmo, e a imposição de controle, restrições e privilégios: como a imunidade à crítica comportamental, a “Bolsa Gay”, e até uma exótica proposta de pesquisa sobre a “Homofobia ambiental” [4]. Medidas estritamente necessárias, acreditam os revolucionário, pois, do alto de sua privilegiada sabedoria, eles estão certos sobre o que é melhor para uma sociedade de ignorantes [5].
 
Assim se desdobra o ininterrupto processo revolucionário, com seus mais novos e obstinados guerrilheiros vestidos e trajados a caráter.


 


Obs. Para que não haja nenhum mal-entendido: para os que não conseguem distinguir a Homossexualidade do Movimento Gay, Cf. BRAGA, Bruno. “Família do ‘Novo Milênio’?” [http://b-braga.blogspot.com.br/2011/08/familia-do-novo-milenio-bruno-braga.html].

 
Referências.
 
[1] BRAGA, Bruno. “Surto infausto” [http://b-braga.blogspot.com.br/2012/01/surto-infausto.html].
 
[2] LACLAU, Ernesto. Hegemony & Socialist Strategy: Towards a Radical Democratic Politics. Editora Verso: London/New York, 1985.
 
[3] Jean Wyllys em entrevista para a Revista “Rolling Stone” [http://www.rollingstone.com.br/edicao/59/a-cruzada-libertadora-de-jean-wyllys].
 
[4]. Cf. Respectivamente, PL-122/06 e Promoção da Cidadania e dos Direitos Humanos de LGBT [http://portal.mj.gov.br/sedh/homofobia/planolgbt.pdf], Itens 1.2.33 e 1.4.10.
 
[5] Estas são suas próprias palavras. Cf. http://www.youtube.com/watch?v=ixm4R63vKt8&feature=player_embedded

Saturday, January 07, 2012

Surto infausto.
Bruno Braga.

 
Em artigos e textos passados procurei expor algumas perturbações sintomáticas apresentadas por aqueles que reivindicam o poder para “transformar o mundo”, os “revolucionários”. Um destes casos patológicos é a “autovitimização” compulsiva do frade dominicano Betto [1] – uma pessoa que não se contenta com o status e o prestígio de um “intelectual”, e nem com a condição de conselheiro pessoal do ex-presidente Lula; que julga insuficiente o patrocínio e o financiamento dos seus projetos por todas as esferas do poder público, e faz pouco do apoio do maior órgão de mídia do país para a produção cinematográfica que transformou em filme o seu livro. Mesmo com todo este suporte, Frei Betto ainda se sente censurado, constrangido, reprimido por “forças ocultas” – o que representa, caso se confie na sinceridade dos seus lamentos e temores, uma flagrante patologia. Porém, este não é o único surto registrado na biografia do ilustre frade.
 
No seu livro “Memórias do esquecimento” [2], o jornalista e escritor Flávio Tavares conta que ele, duas militantes da AP (Ação Popular) e Frei Betto, desfrutaram da tradicional cozinha do Restaurante Moraes, em São Paulo. Depois de banquetearem-se, os “camaradas” saíram em um carro chamativo – era “último modelo”, conta o jornalista – à procura de mendigos: em um gesto de generosidade, queriam dar aos pobres o que havia sobrado dos filés e batatas fritas que não conseguiram comer. No entanto, depois de rodarem insistentemente, a bordo da máquina possante, sem encontrar um só mendigo, os revolucionários decidiram jogar os restos em uma lixeira – o fez o piedoso frade, “que como perseguido pelo diabo, voltou correndo ao carro” (sic).
 
A generosidade dos revolucionários poderia ter saciado a fome de um miserável naquela noite – mesmo com uma oferta de sobras e restos -, caso tivessem se deparado com um pelo caminho. Porém, alguns elementos que compõem este episódio parecem destoar da conduta de “revolucionários” Socialistas-comunistas: restaurante tradicional? Filé e batata frita? Carro “último modelo”? Ora, estes “camaradas” não estavam lutando, ao mesmo tempo, contra o modo de vida “burguês”, contra o “consumismo”? Não estavam eles em guerra para acabar com a opressão imposta pelo “poder do capital” e para destruir o “Imperialismo”? Sim – e eles ainda acreditavam que a revolução seria realizada pelo proletariado, pelo “povo”, mesmo tendo, entre eles, o herdeiro de uma família com título de nobreza, industrial da produção de vinho, e até considerada uma família de “senhores feudais”: o próprio Flávio Tavares [3].
 
Este episódio poderia ser cômico – uma confusão produzida por jovens idealistas. Acontece que, aquelas mesmas pessoas também estavam armadas, promoveram com tiros e explosões uma série de atentados que vitimaram inocentes. Aqueles “revolucionários” não eram apenas jovens idealistas querendo, generosamente, oferecer batatinha frita para os pobres e famintos. Além de receberem o financiamento e as armas de governos estrangeiros, os revolucionários estavam orientados: seguiam as instruções de uma cartilha redigida pelo companheiro de luta do nobre Frei Betto, Carlos Mariguella. Este, no seu “Manual do Guerrilheiro” revela: "No Brasil o número de ações violentas praticadas é já muito elevado. Entre estas ações estão mortes, explosões de bombas, captura de armas, de explosivos e munições, “expropriações” de bancos, ataques contra prisões, etc., atos que não podem deixar dúvidas sobre as intenções dos revolucionários" [4].
 
“As intenções” dos “revolucionários” não era derrubar a “ditadura militar”, e nem mesmo implantar um regime democrático - o propósito das organizações terroristas é revelado pelo próprio Flávio Tavares, aquele mesmo das batatinhas fritas: “Todas elas queriam o socialismo” [5].
 
Para o piedoso Frei Betto o modelo adequado de socialismo seria o de Cuba, um dos “patrocinadores” das organizações terroristas: “Para mim Cuba era o paradigma”, declara de maneira nostálgica o frade. E um dos segredos do regime implantado na ilha, ainda segundo o Frei, está em seu “Comandante” – Fidel Castro - que soube cultivar “valores muito originais” [6].
 
Ora, apenas uma cabeça profundamente perturbada poderia considerar como “valores muito originais” a perseguição de seus inimigos, a prisão política, o encarceramento de homossexuais, o assassinato de cristãos, e o fuzilamento [7]. Acontece que, valores deste tipo são cultivados inclusive pelo próprio frade guerrilheiro, que certa vez esclareceu: “Quero deixar claro que admito a pena de morte em uma única exceção: no decorrer da guerra de guerrilhas” [8]. Portanto, as medidas do regime cubano não espantariam o “camarada”, já que, por se tratar de um “governo revolucionário” – e por isso mesmo em uma revolução permanente -, é a instalação do “modus operandi”, das estratégias, táticas e dos valores morais dos seus militantes no poder político e administrativo.
 
Contudo, se em um momento de instantânea lucidez hipócrita, no qual considera o fuzilamento um “excesso”, o singelo e generoso frade dominicano tem a solução: “reinventar o Socialismo” [9]. E Frei Betto está empenhado nesta tarefa, não apenas em Cuba e no Brasil, mas na América Latina. Ele foi promovido, de “intermediário”, “contato”, e encarregado do setor de imprensa no período do regime militar, a “Intelectual” e colaborador do Foro de São Paulo, o órgão que promove o Socialismo na região [10].
 
Agora, quem ocupa o antigo posto do frade, que juntamente com o movimento estudantil, artistas, pastores de diversas confissões e religiosos, são engrenagens fundamentais para o processo revolucionário – como destaca o seu manual de estratégias? [10]. E quem atua entre os sindicalistas, jornalistas, professores, membros do corpo docente universitário, políticos, líderes comunitários e de movimentos de minorias, promotores culturais, ONGs, capitalistas aliados, etc.? Quem está comprometido com a revolução e quem colabora indiretamente com ela como um mero simpatizante ou como um “idiota útil”?
 
O grito de Rousseau é pertinente: “Sors de l’enfance, ami, réveille-toi!” [“Sai de tua infância, amigo, acorda!”] Um episódio envolvendo batatinhas fritas, um carro “último modelo”, se desdobra em movimento revolucionário internacional, em terrorismo. O presente capítulo da história apresenta a sociopatia do passado com o poder nas mãos. Com recursos incalculáveis e inúmeros mecanismos de ação disponíveis, ela ainda brada discursos de “autovitimização” – um surto psicótico, gerador de trágicos efeitos reais e concretos, cujo ápice é promover a revolução. “Imperialismo”? “Capitalismo”? “Moral burguesa”? “Socialização”! “Democratização”! – “Acorda, amigo!”, diria Rousseau.  

 
Referências.
 

[1]. BRAGA, Bruno. A autovitimização de um frade dominicano [http://dershatten.blogspot.com/2011/01/autovitimizacao-de-um-frade-dominicano.html].
 
[2] O detalhe curioso é que, antes de sair em nova edição, revista e ampliada, pela Editora Record, o livro de Flávio Tavares havia sido publicado pela editora “burguesa”, “conservadora”, “saudosista da Ditadura Militar”, etc., etc., Globo – mesmo assim, os “revolucionários” continuem esbravejando contra as organizações da família Marinho.
 
[3] Cf. a entrevista de Flávio Tavares para a Revista Brasileiros [http://www.revistabrasileiros.com.br/edicoes/42/textos/1352/].
 
[4]. Cf. MARIGHELLA, Carlos. Manuel de Guerilla Urbaine. p. 06. [Tradução livre da versão eletrônica].
 
[5]. Cf. “Civis e a ditadura militar: a Revolução no Brasil” [http://guiadoestudante.abril.com.br/estudar/historia/civis-ditadura-militar-revolucao-brasil-435432.shtml].
 
[6]. Cf. “Claudia Korol – Diálogo con Frei Betto en Cuba” [http://www.panuelosenrebeldia.com.ar/content/view/335/245/].
 
[7] Cf. CORTOUS, 1991.  


[8] Cf. BETTO, Frei. Paraíso Perdido: nos bastidores do Socialismo.
 
[9] Cf. referência 6.
 
[10]. Na principal revista da instituição, “América Livre”, Frei Betto declarou: [...] “é preciso não ceder à ingênua pretensão de fazer a revolução pelo voto”.
 
[11]. MARIGHELLA, p. 02.

Tuesday, January 03, 2012

A sobrevivência do ideal revolucionário.




 

Bruno Braga.

 
Não resta dúvida que o protesto "Occupy Wall Street" e suas ramificações são um engodo estrategicamente criado e financiado por grupos que objetivam a concentração do poder. As manifestações não são espontâneas: elas são articuladas por aliados do próprio governo americano e são abastecidas por alguns de seus inimigos capitalistas, como George Soros [1] – além disso, os protestos se valem de um falso pretexto, o da origem da crise financeira americana.

O movimento "Occupy Wall Street" conta não só com um poderoso aparato político-financeiro, mas tem um braço também no domínio virtual com um grupo de hackers chamado "Anonymous" – que se caracteriza com a máscara de Guy Fawkes, popularizada pelo filme "V for Vendetta" (2005). Recentemente os revolucionários virtuais distribuíram pela internet um curioso "guia de sobrevivência" [2], que seria útil no caso de "revoluções violentas", já que, alerta o grupo, protestos podem ser uma "confusão sangrenta" (p. 03).

O manual fornece uma séria de orientações de como estocar alimentos, água, e suprimentos médicos. Para os manifestantes estabelece artifícios de como escapar de balas de borracha, gás lacrimogêneo e balas reais – afinal, em determinado estágio da revolução, esclarece o guia, a polícia não fornecerá ajuda e, dependendo da situação, será até o inimigo (p. 04).

A divulgação deste guia de sobrevivência, no entanto, é, provavelmente, ineficaz para desacreditar definitivamente o protesto "Occupy Wall Street". Não por causa da consistência do material, que somado a outros, de inequívoca evidência, seriam mais do que suficientes para convencer o idólatra mais inocente dos pecados que o seu próprio santo de devoção admitiu cometer. Mas porque o debate público é construído com um sem número de estereótipos, adornados com "crença nos ideais" e a chancela de "Intelectuais", jornalistas, acadêmicos e "especialistas". Há uma ruptura com o mundo real e concreto para o engajamento na fantasia da eterna revolução, em um esforço mórbido para convencer que aquilo que os próprios olhos vêem é uma ilusão. Assim se instaura o mundo imaginário, elaborado por uma intelectualidade já, ela mesma, histérica: com comportamento e reações de destempero que traduzem nitidamente o que é viver mergulhado em confusas fantasias. No entanto, ela ainda alimenta e persegue o sonho que muito tem custado ao cidadão comum, o sonho de "transformar o mundo".

 
Referências.

[1]. Para os interessados em analisar alguns dados e documentos, consultem os artigos anteriores nos quais o assunto foi abordado: "O risco de freqüentar a posição de contra-exemplo é tornar-se um mau-exemplo" [http://b-braga.blogspot.com.br/2011/10/o-risco-de-frequentar-posicao-de-contra.html]; "Um Contra-exemplo e uma Controvérsia – Episódio II" [http://b-braga.blogspot.com.br/2011/11/um-contra-exemplo-e-uma-controversia_15.html]; e "Projeção de sentimentos e análise política" [http://b-braga.blogspot.com.br/2011/11/projecao-de-sentimentos-e-analise.html].

[2]. O "Anonymous Survival Guide" pode ser acessado em: http://pt.scribd.com/doc/76593171/Anonymous-Survival-Guide-for-Citizens-in-a-Revolution