Introdução do livro "Bearing False Witness: Debunking Centuries of Anti-Catholic History". Templeton Press, 2016. pp. 01-07 [1].
Tradução. Bruno Braga.
Eu crescia como um Americano Protestante com ambições intelectuais e sempre perguntava por que os Católicos faziam tanto barulho no Dia de Colombo. Eles não percebiam a ironia no fato de que, embora Colombo fosse Católico, sua viagem de descoberta havia sido realizada com a oposição inflexível de prelados Católicos, que citavam provas bíblicas de que a Terra era plana e que qualquer tentativa de alcançar a Ásia navegando a Oeste acabaria com a queda das embarcações no abismo do mundo?
Todo mundo sabia isso sobre os Católicos e Colombo. Nós não aprendemos isso apenas na escola, a história de Colombo provando que o mundo é redondo também foi contada em filmes, encenada na Broadway e apresentada até em canções populares. Mas, lá estavam eles todo dia 12 de outubro: uma multidão de membros dos Cavaleiros de Colombo, acompanhada de sacerdotes, marchando em comemoração à chegada do "Grande Navegador" no Mundo Novo. Quanto absurdo.
E como foi surpreendente descobrir anos mais tarde que toda a história sobre por que os consultores Católicos fizeram oposição a Colombo era mentira.
Por volta do século XV (e por séculos antes) todo Europeu instruído, incluindo os prelados Católicos, sabia que a Terra era redonda. A oposição a Colombo não era quanto à forma da Terra, mas sobre o fato de que ele estava barbaramente enganado a respeito da circunferência do globo. Ele estimou que era de aproximadamente 2.800 milhas das Ilhas Canárias ao Japão. Na realidade, era de 14.000 milhas. Seus oponentes clericais sabiam o quão distante isso realmente era e opuseram à viagem o argumento de que Colombo e seus homens morreriam todos no mar. Não estivesse o Hemisfério lá, e ninguém sabia que ele existia, "Niña", "Pinta" e "Santa Maria" poderiam muito bem ter caído da Terra, porque todos a bordo teriam morrido de fome e sede.
Surpreendentemente, não havia nenhum indício de que Colombo teve que provar que a Terra era redonda nem no seu próprio jornal nem no livro do seu filho, "História do Almirante" ["History of Admiral"]. Trezentos anos depois, a história ainda não era conhecida, quando então apareceu na biografia de Colombo publicada em 1828. O autor, Washington Irving (1783-1859), é mais conhecido por sua ficção - em "A Lenda da Caverna Adormecida" ["The Legend of Sleepy Hollow"] ele apresentou o Cavaleiro sem Cabeça. Embora o conto sobre Colombo e a Terra plana fosse ficcional, Irving o anunciou como fato. Quase que imediatamente, a história foi abraçada com entusiasmo pelos historiadores, que, de tão certos da perversidade e estupidez da Igreja Católica, não viram nenhuma necessidade de procurar uma comprovação adicional - alguns deles devem ter percebido que a história surgiu do nada. De qualquer forma, foi como a tradição de Colombo provar que o mundo era redondo entrou em todos os livros.
No tempo de Washington Irving, este modelo foi muito utilizado: várias mentiras e distorções entravam no cânon histórico com o selo distinto de aprovação acadêmica, desde que apresentassem de forma negativa a Igreja Católica (tenha em mente que a entrada dos Católicos foi recusada em Oxford e Cambridge até 1871, e algumas faculdades Americanas não os admitiam naquela época). Lamentavelmente, ao contrário da história de Colombo, muitas dessas falsas acusações anti-Católicas permanecem como parte reconhecida do patrimônio histórico ocidental. Uma pesquisa realizada em 2009 nos livros da Áustria e da Alemanha revelou que a mentira sobre Colombo e a Terra redonda ainda era ensinada naqueles países!
Tudo começou com as guerras Europeias decorrentes da Reforma, que opuseram Protestantes e Católicos, ceifando milhões de vidas, e durante a qual a Espanha emergiu como a maior força Católica. Em resposta, Inglaterra e Holanda promoveram intensas campanhas de propaganda que representavam os espanhóis como bárbaros fanáticos e sanguinários. O notável historiador medieval, Jeffrey Burton Russell, explica: "Vários livros e panfletos foram despejados das prensas do norte, acusando o Império Espanhol de depravação desumana e atrocidades horríveis... A Espanha foi representada como um lugar de escuridão, ignorância e mau". Estudiosos modernos e informados não só rejeitam essa imagem maliciosa, eles deram a ela um nome: "Lenda Negra". No entanto, essa impressão da Espanha e dos Católicos espanhóis continua muito viva em nossa cultura - a simples menção à "Inquisição Espanhola" evoca repugnância e indignação.
O mito da barbaridade Católica. Essa gravura de 1598, publicada na Holanda, mostra um aristocrata Espanhol alimentando seus cachorros com crianças indígenas. Típica propaganda anti-Espanhola, anti-Católica daquele tempo (Imagem e legenda publicadas no livro de Rodney Stark em tela).
Mas não foram apenas Protestantes raivosos que inventaram e abraçaram esses contos. Muitas das falsidades consideradas nos capítulos subsequentes foram patrocinadas por escritores anti-religiosos, especialmente durante o chamado Iluminismo - cujos trabalhos foram aceitos e tolerados só porque eram vistos como anti-Católicos, e não pelo que realmente eram - mais recentemente, esse tipo de intelectual tem exibido sua irreligião e o seu desprezo pelo Catolicismo. Na sua época, no entanto, Edward Gibbon (1737-1794) certamente estaria em apuros, se as amargas visões antirreligiosas que ele apresentou na "História do declínio e queda do Império Romano" ["The History of the Decline and Fall of the Roman Empire"] não fossem vistas incorretamente como aplicadas apenas ao Catolicismo Romano. Mas, como o Catolicismo era a única Igreja Cristã no tempo do Império Romano, os leitores de Gibbon tomaram os seus ataques como específicos ao Catolicismo e não destinados à religião em geral.
Embora Gibbon fosse um dos primeiros "sectários importantes" - ele está em ótima companhia - a lista dos celebrados intelectuais anti-Católicos (alguns deles ainda vivos) é de fato longa. Encontraremos dezenas deles nos próximos capítulos - alguns, muitas vezes. Pior. Nos últimos anos, algumas das contribuições mais malignas para a história anti-Católica são de Católicos alienados, muitos deles desistiram do seminário, são ex-padres e ex-freiras, como John Cornwell, James Carroll e Karen Armstrong. Normalmente, ataques vindos de desertores de um grupo particular são tratados com alguma cautela. Porém, ataques contra a Igreja Católica proferidos por Católicos "não praticantes" são amplamente considerados como de uma confiabilidade especial!
Em todo caso, se você acredita em qualquer uma das seguintes afirmações, deve suspeitar que o seu conhecimento sobre a história do Ocidente está distorcido:
. A Igreja Católica motivou e participou ativamente de quase dois milênios de violência anti-Semita, justificando-a em razão de que os judeus foram responsáveis pela Crucifixão, até que o Concílio Vaticano II, envergonhado, retratou-se em 1965. Mas, a Igreja ainda não se corrigiu pelo fato de Pio XII ser justamente conhecido como o "Papa de Hitler";
. Só recentemente tomamos conhecimento de evangelhos cristãos extremamente iluminados, que há muito tempo foram suprimidos por prelados Católicos de mente estreita;
. Uma vez no poder, como a igreja oficial de Roma, os Cristãos perseguiram rápida e brutalmente o paganismo;
. A queda de Roma e a ascendência da Igreja precipitaram o declínio da Europa em um milênio de ignorância e de atraso. Essa Idade das Trevas durou até o Renascimento / Iluminismo, quando intelectuais seculares romperam as centenárias barreiras católicas contra a razão;
. Iniciadas pelos Papas, as Cruzadas foram o primeiro capítulo sangrento na história do brutal e sem motivo colonialismo Europeu;
. A Inquisição Espanhola torturou e assassinou um número enorme de pessoas inocentes por crimes "imaginários", como bruxaria e blasfêmia;
. A Igreja Católica temeu e perseguiu os cientistas, como o caso de Galileu deixa claro. Por isso, a "Revolução" Científica aconteceu principalmente nas sociedades Protestantes, pois somente lá a Igreja Católica não podia suprimir o pensamento independente;
. Estando completamente confortável com a escravidão, a Igreja Católica não fez nada para se opor à sua introdução no Novo Mundo nem para fazê-la mais humana;
. Até pouco tempo, a visão Católica do Estado ideal era resumida na frase "O direito divino dos reis". Consequentemente, a Igreja resistiu de forma dura aos esforços para estabelecer governos mais liberais, apoiando ativamente ditadores;
. Foi a Reforma Protestante que quebrou o controle repressivo Católico sobre o progresso e inaugurou o capitalismo, a liberdade religiosa e o mundo moderno.
Cada uma dessas afirmações é parte de uma cultura comum, que é amplamente aceita e frequentemente repetida. No entanto, as afirmações são falsas e, muitas, o exato oposto da verdade! Um capítulo será dedicado a resumir as repetições recentes de cada uma e demonstrar que são falsas.
É pertinente observar que eu não decidi escrever este livro do nada. Antes, no processo de redação de outros livros sobre história medieval e Cristianismo primitivo, encontrei sérias distorções enraizadas em um evidente anti-Catolicismo - os autores muitas vezes expressavam de forma explícita o seu ódio contra a Igreja. Tendo escritos paralelos nesses primeiros livros sobre muitos dos exemplos citados acima, decidi finalmente que a expressiva história anti-Católica é muito importante, e as suas consequências são muito generalizadas para serem deixadas para refutações dispersas. Então, reuni, revi e substancialmente ampliei minhas questões anteriores e fui acrescentando outras. Ao fazê-lo, não procurei "branquear" a história da Igreja. Naqueles mesmos livros, escrevi longamente sobre clero corrupto, ataques brutais contra "hereges" e sobre os mais recentes desvios e faltas da Igreja, como encobrir padres pedófilos e a defesa equivocada da Teologia da Libertação. Porém, não importa o valor que se coloque nesses aspectos negativos da história da Igreja, ele não justifica os exageros extremos, as acusações falsas e as fraudes patentes tratadas nos capítulos seguintes. Diante dessa enorme literatura de mentiras, eu ouvi as palavras de Garrett Mattingly (1900-1962), da Universidade de Columbia: "Aos mortos não importa se recebem a justiça das mãos das sucessivas gerações; mas, para os vivos, fazer justiça, ainda que tardiamente, deveria importar".
Você deve estar se perguntando, se essas mentiras são tão evidentes, por que então elas ainda perduram? Em parte, porque são reforçadas e estão profundamente enraizadas na nossa cultura comum, dando uma impressão de que seria impossível que fossem mentira. Supõe-se facilmente que, na nossa época "iluminada", essas afirmações, se fossem falsas, teriam sido rejeitadas há muito tempo. Eu confesso que, quando me deparei pela primeira vez com a afirmação de que a Inquisição Espanhola derramou muito pouco sangue e que foi principalmente uma grande força de apoio à moderação e à justiça, eu a recusei como um ato de revisionismo estranho e interessado em atenção. Porém, ao investigar mais, fiquei chocado ao descobrir que, na verdade, entre outras coisas, foi a Inquisição que impediu a febre assassina contra a bruxaria, que floresceu na maior parte da Europa durante os séculos XVI e XVII, espalhando-se para a Espanha e para a Itália. Em vez de queimar bruxas, os inquisidores enforcaram algumas poucas pessoas por terem elas queimado bruxas.
Tenha certeza, não será exigido de você que tome as minhas palavras nessas refutações. Fiz pesquisas básicas necessárias para derrubar certas afirmações espúrias anti-Católicas, e, nesses casos, documentei tanto as minhas descobertas que qualquer um pode checá-las. Mas, na maioria dos casos, eu simplesmente relato a visão predominante entre os especialistas qualificados. Infelizmente, mesmo que reclamem por causa da sobrevivência de uma fabricação anti-Católica, a maior parte desses especialistas continha escrevendo apenas para eles mesmos, não se compromete a compartilhar o seu conhecimento com o público em geral - o mito de Colombo continuou nos livros e na cultura popular décadas após os estudiosos terem traçado a sua origem fraudulenta. Eu me comprometi a fazer o trabalho desses grandes estudiosos - amplamente acessíveis - tendo o cuidado de citar e reconhecer o trabalho deles - biografias curtas da maioria dos colaboradores serão apresentadas em cada capítulo.
Finalmente, eu não sou Católico, e não escrevi este livro na defesa da Igreja. Eu o escrevi na defesa da história.
REFERÊNCIAS.