Bruno
Braga.
Um personagem
que já frequentou algumas vezes este espaço é assunto novamente - Dimas Enéas.
Na última semana, uma mensagem redigida por ele, e com o carimbo de uma foto na
qual estampa um largo sorriso, circulou pela internet. Nela Dimas pede ajuda ao
destinatário – que teve sua identidade preservada – para a contratação de um
funcionário para o Departamento de Comunicação da Prefeitura Municipal de
Barbacena. Para que fosse admitido, o candidato ao posto teria que cumprir uma
exigência extravagante: além do pré-requisito fundamental para a função –
“escrever bem” – ele deveria ser “politicamente articulado e do nosso campo
político” (PT-PMDB) [1].
O
privilégio concedido a aliados é uma prática comum para os que detêm o poder político
– no entanto, é um hábito oculto, por ser absolutamente censurável. No caso em
tela, o que causou escândalo, e uma série de manifestações e críticas, foi
determinar e tornar público, sem qualquer constrangimento, pudor ou embaraço, uma
exigência partidário-político-ideológico para uma função técnica. Embora esta mensagem
possa ter implicações jurídicas e legais, repercussão no plano político e
eleitoral, ela poderia ser examinada sob o ponto de vista intelectual e
cultural.
Por
uma destas ironias do acaso, o primeiro artigo de Dimas Enéas que comentei
tinha o título “Barbacena e sua encruzilhada” [2]. O estimulo para redigir aquele
comentário surgiu das observações sobre o artigo feitas por outros leitores,
que elogiavam a isenção da análise do autor e sugeriam, inclusive, a sua
candidatura a um posto público na cidade. Valendo-me de critérios objetivos,
rastreando a formação e a orientação ideológica de Dimas Enéas, a sua posição
no tabuleiro do jogo político, esforcei-me para esclarecer que a alegada “imparcialidade”
do articulista era apenas uma maquiagem que escondia objetivos e interesses – e
que não era necessário que Dimas ocupasse um cargo de autoridade política,
porque no tabuleiro do jogo ele já era um agente político enquanto “Intelectual”
(Cf. Anexo, que traz a reprodução integral das minhas observações).
Depois
que a minha análise foi postada, alguns leitores se manifestaram. Fui chamado
de “ultrapassado”, “antigo”, “preconceituoso”, “ciumento”, “invejoso”,
“hipócrita” – alguém que discursa com “ódio”, “rancor”. Houve quem afirmasse
que sou destas pessoas que “ficam o tempo todo vendo chifre em cabeça de
macaco” – por causa das críticas feitas aos “revolucionários”, sobretudo aos
Socialistas-comunistas. Aconteceu, também, que o segundo comentário que redigi,
no qual me dispus a esclarecer alguns pontos controversos, e contestar as
críticas às minhas primeiras considerações, não foi postado pelo Conselho Editorial
do portal “Barbacena Online”, encarregado da análise prévia dos textos, antes
de publicá-los [3].
Não
– este relato não é uma lamentação: ele é apenas a exposição do percurso de um
esforço de compreensão dos fatos, e da confirmação dos seus termos pela divulgação
da comprometedora mensagem de Dimas Enéas. Simultaneamente este desdobramento revela
algo preocupante sobre os envolvidos: eles se afastaram do pressuposto
fundamental de suas atividades, a busca da Verdade, o esforço sério e honesto pelo
conhecimento. Este elemento aparece corrompido em um agente político que assina
artigos como “cientista”; em um portal de notícias que deveria estar
comprometido com a informação e livre expressão do leitor, mas que filtra seus
comentários. E, mesmo os leitores merecem a denúncia, porque com desprezo pelo esforço
intelectual, incapazes de reconhecer uma análise objetiva dos fatos, preferem
aquilo que acolhe os seus sentimentos e carências - por isso eles são
encantados por discursos que reivindicam a “democratização”, a “socialização”, a
“liberdade de imprensa” e “revolução das mídias sociais”, proferidos pelos
mesmos que exigem para a contratação de um jornalista, que o candidato ao posto
seja “politicamente articulado e do nosso campo político (PT-PMDB)” [Dimas Enéas].
Depois
de um ano do primeiro comentário (Cf. Anexo), a análise nele contida está
consumada. Mas, quantos virão a público para assumir a sua responsabilidade? Quem
reconhecerá o seu erro, o seu equívoco? Quantos admitirão que privilegiaram a sua
artificial reputação de “bom moço”, de pretenso “defensor dos pobres e
oprimidos”, da “liberdade” e da “democracia”, em detrimento da discussão
objetiva, do conhecimento e da busca da Verdade? Não – não é para mim que
precisam prestar contas, nem reconhecer o acerto da minha análise política –
mas, sim, para o público com o qual dizem estar comprometidos.
(*)
Nota.
Entrei
em contato com Dimas Enéias para que ele pudesse esclarecer os fatos. Em e-mail
enviado em 18 de Fevereiro de 2012, ele explicou que não ocupa cargo de
confiança ou comissionado na Prefeitura de Barbacena, e que não é membro da
Executiva do PT na cidade – disse, sim, que é membro do Diretório do partido na
cidade, e que participa das “discussões e articulações políticas há décadas”.
Ele acrescenta que não havia a intenção de “arranjar emprego público para X ou
Y”, atender “apadrinhamentos” ou “clientelismo” – embora considere que não
poderia indicar para o trabalho alguém que estivesse afinado ao campo político
da oposição (PSDB), porque o profissional deveria atuar junto às mídias sociais
respondendo as questões postas sobre a atual gestão pública municipal. Dimas
acrescenta que apenas atendia a um pedido de uma amiga, responsável pelo setor
de comunicação da Prefeitura de Barbacena: contratar um jornalista para atuar
na área das mídias sociais.
Acrescento
que este espaço está aberto a qualquer um dos interessados que pretenda
esclarecer a questão.
Referências.
[1].
O que aparece entre aspas são as palavras do próprio Dimas.
[2].
O artigo pode ser acessado no link [http://www.barbacenaonline.com.br/noticias.php?c=5451&inf=11].
No entanto, aqui ele aparece “higienizado”: com a reformulação do portal
“Barbacena Online”, os comentários dos leitores foram abolidos. Portanto, a
minha referência é uma cópia de segurança da antiga publicação.
[Anexo]
. Primeiro
comentário sobre o artigo “Barbacena e sua encruzilhada”, de Dimas Enéas Soares
Ferreira.
Seria pertinente fazer duas
observações, fundadas não apenas no texto de Dimas E. Ferreira, mas também nos
comentários subseqüentes.
A primeira diz respeito à alegada
“imparcialidade” do autor em seu artigo. Dimas não abre mão de suas convicções
político-partidárias – a esquerda social-comunista, representada pelo PT. Se o
autor não o faz diretamente como em textos anteriores, trata, neste, de velar,
ocultar, ou higienizar seu direcionamento político. De qualquer maneira é
possível identificá-lo na dissertação apresentada. O autor faz uso de um
vocabulário próprio do esquerdismo; é o caso, por exemplo, da aplicação do
termo “elite”, sobretudo associado a “elite empresarial”. A partir desta visão
estereotipada traça uma “narrativa histórica” para justificar toda sua
“engenharia social”, materializada em propostas político-sociais. Se em um
momento Dimas acena com uma surpreendente “parceria” entre o “mercado” e o
poder público, para mitigar o seu enérgico esquerdismo de outrora, é preciso
lembrar que o próprio Marx observa o Capitalismo como uma etapa fundamental
para o projeto Socialista-Comunista, porém um Capital de “potência social”
(MARX, “Manifesto do Partido Comunista”, 2002, p. 61). Esta “potência social”,
justamente a proposta do autor do artigo, significa a aplicação do capital em
duas frentes: não apenas na esfera dita “social”, mas no fortalecimento da
estrutura do poder, quer dizer, do próprio partido que rege e orienta as
políticas públicas.
Outra consideração que aponta a
“parcialidade” de Dimas Ferreira é a sua proposta para dissolver uma pretensa
estrutura “classista” (mais uma vez o vocabulário e a leitura histórica
marxista: “A história de todas as sociedades que existiram até hoje é a história
da [luta de classes]”, MARX, 2002, p. 45). Para isso oferece o
“multiculturalismo”, com um propósito aparentemente absurdo: instaurar uma
“democracia” fundada na “diferença”, quer dizer, estabelecendo “diferenças
étnicas, culturais, de opção sexual, de crença, etc” (nas próprias palavras do
autor) – um programa nítido de “discriminação reversa”, no tratamento
“diferenciado” de tais minorias. Acontece que, se este propósito absurdo fere o
bom senso, é completamente justificável do ponto de vista da “estratégia
esquerdista”. Existe, por parte da esquerda, um imenso esforço para “construir
novas minorias”, estabelecidas por diferenças muitas vezes “forjadas” e
“artificiais”. Contudo, este é um esforço recompensado pela realização do
projeto, que facilita as manobras do poder político, já que transforma as
“minorias” em “grupos de pressão”, e as suas lideranças, conseqüentemente, em
agentes políticos. Nestes termos, os grupos e suas respectivas lideranças
passam a contribuir com a grande força, e o diferencial, da esquerda, a
“militância” – porque manifestações, protestos, e, principalmente,
reivindicações, não são feitos por cidadãos comuns, que resolvem sair de suas
casas para ocupar praças públicas, mas sim por entidades, por grupos
organizados, que orientam toda a ação. Assim, para o espectador desatento,
estas manifestações podem parecer a “voz do povo”, quando na verdade são os
anseios de um grupo, ou de um Partido (Cf. Ernesto
Laclau & Chantal Mouffe. Hegemony & Socialist Strategy: Towards a
Radical Democratic Politics).
A segunda observação a ser feita
refere-se à atuação política do autor do artigo, discutida em alguns
comentários anteriores. Além de diretor do Sinpro Minas e professor da Epcar e
da Unipac (“Nota da Redação”), Dimas, como informa [x] (08.02.2011), foi
dirigente da CUT Zona da Mata, membro do Conselho Municipal de Educação, e é
membro do PT, Partido dos Trabalhadores. Através destas atividades Dimas já
exerce um papel político, e de grande influência – ele não necessita de um
mandato político, porque atua em uma esfera de importância fundamental, a
esfera cultural. Desde que Antonio Gramsci se tornou o guru do
Social-Comunismo, e do esquerdismo, o “intelectual orgânico” passou a
desempenhar um papel imprescindível para a tomada e para a manutenção do poder
– comprometido com o partido, ele não visa a “verdade objetiva”, mas atua como
agente de influência psicológica, na formação das idéias, dos pensamentos, do
imaginário das pessoas, modificando hábitos e criando expectativas: é o que o próprio
Gramsci chama, de uma forma bastante peculiar, de “senso comum”. Em outras
palavras, o “intelectual orgânico” não tem nenhuma preocupação com a
compreensão da realidade efetiva, nem com a honestidade intelectual, mas está
completamente engajado na defesa dos “interesses do Partido”. Para articular a
teoria gramsciana com a questão em tela, basta recordar que, Dimas é
articulista, professor Universitário, diretor de sindicato e, sobretudo, membro
do “Partido”, do PT.
Então, feitas as devidas observações,
Dimas Ferreira não é “imparcial” como foi alegado nos comentários precedentes,
e continua, embora neste texto de maneira um pouco mais velada, sua atividade
incansável de militante. Poder-se-ia questionar se ele está consciente de toda
a estratégia esquerdista, definida nos bastidores pelo alto escalão do Partido
– no entanto, a julgar por suas credenciais, é difícil acreditar que Dimas seja
apenas um “Polieznyi”, termo utilizado por Lênin para referir-se aos
“intelectuais ocidentais”.
Bruno
Braga – Barbacena – Publicado no portal “Barbacena Online” em 11 de Fevereiro
de 2011 [11:09:51].