Bruno Braga.
O
“idiota latino-americano” [1] não é um tipo solitário. Ele tem amigos – e
muitos – fora da sua terra. “Intelectuais”, filósofos, sociólogos, políticos,
jornalistas e simpatizantes frequentemente são solidários, admiradores, quando
não patrocinadores. Esta relação de cumplicidade – por vezes de pura má-fé -,
em muitos casos é de absoluta identificação. Eles pensam como o seu amigo
“idiota”. Avaliam e julgam a partir de estereótipos e esquemas prontos: luta de
classes; ricos e pobres; os brancos e índios; exploradores e explorados; os
perversos militares e os idealistas e bravos revolucionários.
A
simpatia do amigo gringo é fortalecida pela atualização do mito do “bom
selvagem”, o idealismo e a justiça do “bom revolucionário”. Sob este olhar, o latino-americano
torna-se o sucessor do proletariado. Ele é a reencarnação do revolucionário que
fracassou na Europa e nos Estados Unidos, mas que vem libertar o continente
explorado e oprimido – a América Latina que, como reza a “Bíblia do idiota” [2],
sangra com as veias abertas.
Percebe-se
que a idiotice não respeita fronteiras. Um colunista da revista americana “The
Nation”, por exemplo, retrata o eterno Che “El Chancho” Guevara – o assassino
covarde, comandante de fuzilamentos, o desastrado estrategista de guerrilha, o
incompetente economista, o ambicioso, o oportunista – assim:
Foi
por amor, como um perfeito cavaleiro, que Che deu início à sua jornada. Nesse
sentido ele foi como um dos antigos santos.
Na
revista “Time” (1960) o guerrilheiro “Chancho” é louvado como um dirigente
hábil e competente:
Com
um sorriso de doce melancolia que muitas mulheres acham devastador, Che Guevara
dirige Cuba com a frieza do cálculo, vasta competência, inteligência superior e
agudo senso de humor.
Estas
– e inúmeras outras – notas corroboram o destrambelhamento do “idiota latino-americano”.
Enquanto ele denuncia aos berros a “mídia imperialista estadunidense”, o
próprio Fidel “El Comandante” Castro confessa sem pudor: “Sou o que sou devido
ao ‘New York Times’”. Quer dizer, o “idiota” não reconhece sequer os seus
“amigos”. O “Comandante”, não. Ele os recebia no acampamento guerrilheiro em
Sierra Maestra, onde vários jornalistas americanos eram acomodados em uma
barraca especialmente identificada: “Barraca da Imprensa”. Deste relacionamento
amistoso e cordial surgiram reportagens, relatos, entrevistas e até mesmo um
documentário - “The Story of Cuba’s Jungle Fighters” -, que idealizavam e
enalteciam a revolução.
O
“idiota” tem amigos gringos também entre os “Intelectuais”. O filósofo francês
Jean Paul Sartre é um deles:
Che
não é apenas um intelectual, mas foi o mais completo ser humano de nossa época:
nosso homem mais perfeito.
Porém,
o ativista americano Abbie Hoffman não poderia demonstrar maior afinidade – marcada
pela “idiotice” – com o seu amigo latino-americano:
Fidel
aparece sentado na borda de um trepidante tanque que entra em La Habana no dia
de Ano Novo... As moças atiram flores no tanque e correm para puxar
brincalhonamente a barba negra do líder. Ele ri alegremente e dá beliscões em
algumas nádegas. O tanque se detém na praça. Fidel deixa cair seu fuzil no
chão, dá uma palmada na coxa e se ergue. Parece um pênis gigantesco posto em
ereção, e quando acaba de se erguer, quão alto é, a multidão se transforma no
ato.
É,
o “idiota latino-americano” não está sozinho. Ele é apenas carente, mas tem
muitos amigos.
Referências.
[1]. Cf. BRAGA, Bruno.
“Para não ser mais um” [http://b-braga.blogspot.com.br/2012/11/para-nao-ser-mais-um.html];
e MENDOZA, Plínio Apuleyo. MONTANER, Carlos Alberto. VARGAS LLOSA, Alvaro. Manual do perfeito idiota latino americano.
Apresentação Mario Vargas Llosa; prefácio Roberto Campos; tradução Rosemary
Moraes e Reinaldo Guarany. 9a. ed. Bertrand Brasil: Rio de Janeiro, 2011.
[2].
Cf. Eduardo Galeano, “As veias abertas da América Latina”, 1971.
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