Bruno Braga.
Como
a “Comissão da Verdade” decidiu redigir a sua própria Hagiografia – uma
Hagiografia da inversão [1] -, seria louvável que ela dedicasse ao
bem-aventurado Alípio de Freitas um lugar no seu altar. Uma glória para o padre
que abandonou a Igreja Católica e viveu a santidade do sacerdócio
revolucionário. Entre as suas benditas obras está a autoria intelectual do
atentado a bomba no Aeroporto de Guararapes em 1966, no Recife.
Durante
anos o autor desta obra de piedade e comiseração permaneceu desconhecido. O
bem-aventurado Alípio, certamente, imbuído do espírito da renúncia, não a
assumiu para evitar que o reconhecimento público excitasse a sua vaidade - o
que macularia o ato de tamanha virtude. No entanto, o comunista Jacob Gorender acabou
revelando o mentor do gesto de generosidade, que a Hagiografia da inversão
consagra com a insígnia de “redemocratização”:
Membro
da comissão militar dirigente nacional da AP, Alípio de Freitas encontrava-se
em Recife em meados de 1966, quando se anunciou a visita do general Costa e
Silva, em campanha farsesca de candidato presidencial pelo partido governista
Aliança Renovadora Nacional (ARENA). Por conta própria Alípio decidiu promover uma aplicação realista dos ensinamentos sobre a
técnica de atentados (GORENDER, “Combate nas trevas”) (o destaque é meu).
O
executor da ideia iluminada do sacerdote revolucionário foi um militante da AP
(Ação Popular), que posteriormente transferiu-se para outra organização
terrorista, a VAR-Palmares – o grupo do qual participou “Estela”, quer dizer,
“Luíza”, ou melhor, “Patrícia”, “Wanda”, enfim, Dilma Rousseff.
O
alvo do atentado no Aeroporto de Guararapes era o Marechal Costa e Silva. Uma bomba
– acomodada em uma mala – foi plantada no saguão para fulminá-lo. O público
aguardava para receber a autoridade. Porém, os alto-falantes do local
anunciaram que, por causa de um problema técnico no avião, o Marechal faria o
percurso de automóvel. Assim, as pessoas que o aguardavam começaram a deixar o
Aeroporto – foi o que evitou uma tragédia ainda maior. Porque, logo depois de
ser encontrada como um objeto perdido, a mala explodiu. Duas pessoas morreram e
outras tantas ficaram feridas – amputações, lesões graves, queimaduras. A
imolação macabra – quer dizer, “sagrada” na Hagiografia da inversão – pretendida
pelo bem-aventurado Alípio foi assim consumada:
Mas,
este não é o único legado do sacerdote da revolução. O Brasil deve louvar o
bem-aventurado Alípio porque, graças a ele, o país tem duas congregações que o
engrandecem: o Comando Vermelho e o PCC (Primeiro Comando da Capital). Quando
esteve no presídio da Ilha Grande, no Rio de Janeiro, Alípio ministrou lições
sapienciais aos presos comuns – técnicas de organização e de guerrilha. Deste
grupo – que faria do “Oratório” de São Filipe Neri um perverso conciliábulo –
foi fundada a “Falange Vermelha”. Porém, como o termo “falange” fazia remissão
ao fascismo, era necessário estabelecer uma denominação que não deixasse
dúvidas sobre a dignidade e nobreza da organização: “Comando Vermelho”. Como os
presos de São Paulo conviviam com os do Rio de Janeiro, os frutos foram
multiplicados posteriormente: em 1993 foi fundado o PCC (Primeiro Comando da
Capital).
O bem-aventurado
Alípio não passou pelas provações do deserto para realizar esta obra
irrepreensível. Ele retirou para Cuba, onde, em 1961, realizou treinamento em
guerrilha – além de meditar em Moscou, em 1962, no Congresso Mundial da Paz. Fatos
que corroboram a iluminação espiritual de Alípio, pois ele se dedicou à
“redemocratização” – inclusive atuando nas Ligas Camponesas - antes mesmo do
maligno Regime Militar. Um espírito que se libertou dos grilhões da Igreja
Católica para, enfim, se dedicar inteiramente ao sacerdócio da Revolução: o
bem-aventurado Alípio foi um precursor da Teologia da Libertação, à qual se
associou.
Por
toda esta vida de renúncia, santidade e devoção – que inclui atentado terrorista,
treinamento guerrilheiro, criação de organizações criminosas -, o
bem-aventurado Alípio merece um lugar no altar da inversão, que será erguido
pela “Comissão da Verdade”. E se os brasileiros ainda não se ajoelharam diante
dele, pelo menos deram a Alípio a modesta contribuição de 700 mil reais [2], e
recolhem para ele um dízimo de 6 mil mensais. Eis o bem-aventurado Alípio, que
a “Comissão da Verdade” deve louvar na sua Hagiografia da inversão.
Referências.
[1].
BRAGA, Bruno. “Hagiografia da inversão” [http://b-braga.blogspot.com.br/2012/11/hagiografia-da-inversao.html].
[2].
O colunista Cláudio Humberto afirma que a generosidade é maior, 1,09 milhão.
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