Bruno Braga.
A
fumaça branca sobre a Capela Sistina anunciou a escolha de um novo Papa.
Reclusos, os cardeais da Igreja Católica decidiram o sucessor de Bento XVI. O argentino
Jorge Mario Bergoglio - que adotou o nome “Francisco” – é agora o Sumo
Pontífice.
A
escolha - a princípio - foi uma surpresa. Bergoglio teria sido – de acordo com
o controverso diário de um anônimo cardeal eleitor - o grande “adversário” de
Joseph Ratzinger no Conclave do qual este saiu Papa Bento XVI. Apesar disso,
para a sucessão do próprio Bento XVI, o nome de Bergoglio não estava nas listas
de apostas elaboradas – e forjadas – por jornalistas palpiteiros e
“vaticanistas” de última hora.
Pela
primeira vez um Papa latino-americano – pela primeira vez um jesuíta. A escolha
do Colégio de Cardeais foi ainda mais surpreendente.
Os
paladinos da “modernidade” e do “novo mundo” aproveitaram a novidade da origem
do Papa para associá-la às “mudanças” – à “abertura” – que exigem da Igreja
Católica. Sim, a escolha de um cardeal que vem da América Latina é
significativa; não, porém, para anunciar “transformações” radicais. Porque o
Sumo Pontífice tem, antes de tudo, o dever de conservar, de ser o guardião da
identidade da Igreja, não importa de onde ele vem, ainda que seja do “fim do
mundo”.
O
argentino Bergoglio é – por princípio e formação – um “soldado” do Papa.
Jesuíta, ele é membro da ordem fundada por Inácio de Loyola no século XVI: a “Companhia
de Jesus,” conhecida por ser a “milícia” da Igreja Católica – pelo trabalho missionário
e pastoral, e pela disciplina e fidelidade.
Mas,
agora Bergoglio não é somente um “soldado”, ele é o próprio Papa. E antes de
aceitar a escolha do Colégio de Cardeais, Bergoglio deu provas de sua
fidelidade à Igreja Católica. Em seu país ele combateu o populismo gay e lutou
contra o ativismo abortista. Durante o Regime Militar, Bergoglio se esforçou
para proteger sua ordem da tentativa de assalto promovida pela Teologia
“Comunista” da Libertação, que pretendia subverter a essência dela – em nome de
Marx e com um fuzil na mão [1] -, transformando-a em instrumento anticatólico
da revolução. Para conservar a unidade da “Companhia de Jesus” ele recorreu à
tradição espiritual dos jesuítas, insistindo para que os padres permanecessem
firmes no trabalho em suas paróquias [2].
A
oposição de Bergoglio à Teologia “Comunista” da Libertação é significativa. Dedicado
ao trabalho social, ele é a prova viva de que o “compromisso com os pobres” não
é criação e nem monopólio dos teólogos, religiosos e simpatizantes da
revolução. A preocupação com os “marginalizados” e com os “excluídos” está no
nascimento da Igreja Católica, e não foi abandonada ao longo de sua História. Algo
que qualquer pessoa, independentemente da sua religião, com um mínimo de boa-fé
– e não idiotizada pela propaganda revolucionária da “libertação” – pode reconhecer.
Bergoglio beija os pés de uma criança com Aids.
Neste
sentido, o nome “Francisco” também é importante. Ele faz referência a Francisco
Xavier, cofundador e pioneiro da “Companhia de Jesus”, conhecido pelo trabalho
missionário e educacional, sobretudo na Ásia – por isso é chamado de “Apóstolo
do Oriente”. Mas, “Francisco” é principalmente uma remissão a São Francisco de
Assis. O santo de hábitos e de vida simples – comportamento cultivado por
Bergoglio –, que enfrentou a corrupção e os excessos dos membros do clero com trabalho
e sacrifício, com o exemplo de sua conduta. Assim ele renovou a Igreja, sem
abandonar a fidelidade ao Papa. Os teólogos e religiosos da
libertação-comunista, ao contrário de Francisco, denunciam a hierarquia da
Igreja Católica e excomungam o Sumo Pontífice sob o pretexto de agirem em favor
dos “pobres”; mas, esta é apenas a forma dissimulada de reivindicar o “poder”
que tanto condenam. O poder total que eles e seu bando revolucionário – tomados
por um macabro surto de autodivinização - julgam necessário para realizar aqui,
neste mundo, o “Paraíso Celeste”.
Sob
esta perspectiva política, a origem do Papa Francisco adquire um contorno
especial. A escolha do cardeal argentino Bergoglio – para a América Latina - pode
ter o mesmo significado que a de Wojtyla para a Polônia e para o Leste Europeu
[3]. O Papa João Paulo II foi um dos grandes opositores do Comunismo durante o
seu Pontificado. Francisco vem de um continente dominado pelos revolucionários
latino-americanos. Eles que estão reunidos no Foro de São Paulo – na organização
criada por Lula e por Fidel Castro, que tem um propósito declarado: restaurar
na América Latina o que foi perdido no Leste Europeu. A Teologia da Libertação
foi – e é – um valioso instrumento para a realização deste funesto projeto de
poder: é o que confessa um dos principais apóstolos da revolução, o
ex-Presidente do Paraguai, Fernando Lugo [4].
João Paulo II e Bergoglio.
Um nome
inesperado para o Ministério Petrino - um jesuíta, um latino-americano. Mas,
antes de tudo um “soldado” que deu provas de sua fidelidade à Igreja Católica, e
que mostra o quanto ainda pode trabalhar por ela. Bergoglio, a escolha que
surpreendeu o mundo certamente não foi por acaso – e pode não ter surpreendido
o seu próprio predecessor.
O
grupo “Comunhão e Libertação” marca certa proximidade entre Joseph Ratzinger e
Jorge Bergoglio. Criado pelo Padre Luigi Giussani em meados do século passado,
o grupo nasce com o objetivo de cuidar da educação tradicional cristã,
principalmente dos jovens estudantes, que frequentemente eram – e são - cooptados
por grupos revolucionários. Em 2005, antes de ser Bento XVI, o cardeal Ratzinger
fez a homilia do funeral do Padre Giussani. Bergoglio – que ainda não era
Francisco – participou como orador das reuniões do grupo “Comunhão e
Libertação”, e divulgou os livros de Giussani em feiras literárias na Argentina
[5].
Sandro
Magister – estudioso dos assuntos da Igreja Católica – relembra que Bergoglio e
Ratzinger não foram propriamente “adversários” no Conclave de 2005. Pelo
contrário, o cardeal argentino foi um dos maiores defensores da escolha de
Ratzinger como Chefe do Colégio dos Apóstolos. Bergoglio teria recebido vários
votos – contra a sua própria vontade – de cardeais que pretendiam impedir a
escolha de Ratzinger [6]. A estratégia não prosperou, e Ratzinger – para a
satisfação de Bergoglio - tornou-se Bento XVI.
João Paulo II e Joseph Ratzinger.
Em
Dezembro de 2011, quando fez 75 anos, Bergoglio apresentou sua renúncia ao
cargo de Arcebispo. Mas o Papa não a aceitou [7]. E fez mais – antes de renunciar
o Pontificado, Bento XVI designou o então cardeal argentino para uma posição de
destaque na Pontifícia Comissão para a América Latina – organismo da Cúria
romana que tem o propósito de estudar, aconselhar e ajudar as Igrejas
particulares em questões doutrinais e pastorais.
Sobre
o Conclave que surpreendeu o mundo, inclusive pela rapidez, Christoph Schönborn
– arcebispo de Viena – fez uma declaração no mínimo curiosa: “Eu não vou dizer
como são as conversas, que são internas. Mas uma coisa é certa: o cardeal
Bergoglio não teria se tornado papa na quinta votação se não fosse um nome
realmente forte para o papado desde o começo” [7].
Não
é possível afirmar que Bento XVI preparou a sua sucessão. O processo é sigiloso
– e os desdobramentos internos daquele que chamou a atenção do mundo estão
preservados da publicidade. Mas, se ele de fato o fez, esta parece ser mais uma
de suas grandes obras: ter sido Bergoglio – agora Francisco – o escolhido.
Bento XVI e o cardeal Bergoglio.
Notas.
[1].
Sandro Magister, “Il primo papa di nome Francesco” [http://chiesa.espresso.repubblica.it/articolo/1350465]
(Fonte, Mirian Macedo)
[2]. John Allen Jr. “New Pope, Jesuit Bergoglio, was
runner-up in 2005 Conclave” [http://ncronline.org/blogs/ncr-today/papabile-day-men-who-could-be-pope-13]
[3].
Desdobro algumas considerações a partir da observação providencial do jornalista
Percival Puggina.
[4].
Cf. BRAGA, Bruno. “O engodo da libertação e o poder” [http://b-braga.blogspot.com.br/2012/10/o-engodo-da-libertacao-e-o-poder.html]. Sobre
a dimensão do poder do Foro de São Paulo na América Latina, Cf. BRAGA Bruno, “Sob
o efeito do encanto” [http://b-braga.blogspot.com.br/2012/07/sob-o-efeito-do-encanto.html];
“Entre peças e engrenagens” [http://b-braga.blogspot.com.br/2012/12/entre-pecas-e-engrenagens.html].
[5].
Cf. Nota [2].
[6].
Cf. Nota [1].
[7].
ACI Digital, “Do ônibus ao Papa móvel: o que não conhecemos do novo Papa
Francisco”, 14 de Março de 2013 [http://acidigital.com/noticia.php?id=25083].
[8].
Cf. Folha de São Paulo, 14 de Março de 2013. “Papa Francisco sempre foi
favorito, diz cardeal” [http://www1.folha.uol.com.br/mundo/1246388-papa-francisco-sempre-foi-favorito-diz-cardeal.shtml].
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